quarta-feira, 23 de outubro de 2019

Do Serviço Nacional de Saúde...

Importa começar por dizer que eu sou uma acérrima defensora do Serviço Nacional de Saúde. SNS, para os amigos.

Já aqui falei deste tema noutras ocasiões, e acho que é das coisas mais importantes que temos e que deve ser preservado e valorizado. 

Ultimamente, lemos e ouvimos cada vez mais notícias sobre a degradação do SNS, sobre as greves, sobre as faltas de pessoal, sobre a degradação das condições e sobre a dificuldade no acesso àquele que é um direito básico e consagrado na nossa Constituição. 

Em Setembro, no espaço de poucos dias, tive experiências completamente opostas no SNS. 

Como já por aqui contei, no dia do casamento da minha irmã, eu ainda dei um salto às urgências pela manhã. Fiz o que achei melhor na altura: liguei para a Saúde 24 (um serviço que merece todas as minhas vénias e aplausos), falei com uma enfermeira amorosa que me fez mil e uma perguntas, e que me disse que o melhor mesmo era ir às urgências, verificar se tinha o dedo partido ou não. 

E lá fui eu, para o hospital da minha área de residência. Entre entrar, ir à recepção, passar pela triagem, fazer um raio-x, ter a consulta com o médico, e ir novamente à recepção, demorei menos de 30 minutos. Menos de 30 minutos. Sim, era Sábado de manhã, estávamos em Setembro e estava um belo dia de praia. Mas foram 30 minutos para uma situação que era tudo menos urgente.

Além do espanto com a rapidez do atendimento, ainda fiz figura de tola, porque fui perguntar quanto e onde é que se pagava. Porque não paguei nada. Nada de nada. Nem sequer o parque de estacionamento, cujo ticket me validaram na recepção.

Parece que por ter sido encaminhada pela Saúde 24, estava isenta da taxa moderadora. Felizmente, não vou vezes suficientes às urgências para saber disto. Mas parece que é mesmo assim. 

E esta situação deixou-me perplexa e a pensar sobre o assunto.

Dias depois, numa consulta num dos maiores hospitais do país na sua área de actuação, fui encaminhada pela minha médica para uma consulta dentro do mesmo hospital, mas de uma área específica. Fui inscrever-me nessa consulta e disseram-me que o tempo de espera médio para a primeira consulta é de um ano. Um ano. Numa especialidade em que, por definição, estamos a lutar contra o tempo.

E esta situação deixou-me perplexa e a pensar sobre o assunto.

Eu não sei se concordo com o facto de não ter pago nada, ou de pagar uma ninharia, quando vou às urgências ou a uma consulta no SNS. A sério. Não me faz muito sentido usufruir de um serviço e não pagar por ele. Porque eu posso pagar por ele.

Acho que a saúde deve ser gratuita para quem, de facto, não a pode pagar. Acho que o Estado social deve intervir quando é necessário. Mas também acho que deve ser equilibrado e sustentável. E não me parece que o seja, nem de longe nem de perto.

Eu sei que há muito quem não concorde. Há quem ache que, como pagamos impostos, devemos ter direito a tudo e mais alguma coisa. Eu, sinceramente, não tenho uma opinião fechada sobre isso. Mas acho que não é justo que eu não pague nada, e que alguém com dificuldades tenha de pagar a taxa moderadora de umas urgências. Não sei. Talvez criar escalões? Inventam tanta coisa, inventem também uma forma de ajudar quem realmente precisa, mas sem fazer do SNS um buraco sem fundo de dívidas. 

Sim, todos os meses o Estado recebe umas centenas de euros à minha conta, entre o que eu desconto e a minha entidade empregadora desconta. Mas desconfio que isso não seja suficiente para pagar o que eu usufruo em saúde, em polícia, em estradas, em escolas, em mil e uma coisas. E muito menos será suficiente para pagar a minha reforma um dia. 

Se eu posso pagar, eu acho que devia pagar. Quanto mais não seja, porque se houvesse mais gente a pagar, ou se os preços fossem adaptados às possibilidades de cada um (como nos jardins-escola, por exemplo), talvez houvesse dinheiro para mais médicos. Talvez se o sistema fosse mais equilibrado e sustentável, os tempos de espera reduzissem.

Sim. Eu preferia pagar 20 euros da taxa moderadora, mais 10 ou 15 ou 20 ou o que fosse do raio-x que fiz. Preferia pagar o parque de estacionamento. Preferia pagar. A sério que preferia. E talvez assim eu não tivesse de esperar um ano por uma consulta de especialidade. 

Mas, lamentavelmente, não há essa opção. O SNS continua a definhar. E eu vou continuar a ver o tempo a passar.

Se me podia virar para o privado? Podia. Mas sempre achei que, para o que realmente importa, é no SNS que devemos estar. Porque é lá que estão os maiores especialistas, os tratamentos mais avançados, os melhores equipamentos. Ou estavam. Que agora já nem sei.

Uma última nota, em jeito de curiosidade: o hospital onde vou esperar um ano por uma consulta, é de gestão pública, o hospital onde demorei 30 minutos nas urgências, é uma PPP. Vale o que vale. Ou então não vale nada.

Só sei que nada sei. Que estou confusa e perdida. E preocupada. Muito preocupada. Porque se nos falha a saúde e a educação (que está pelas ruas da amargura), não sei que país será este... 

segunda-feira, 21 de outubro de 2019

Dos dias em que viver cansa...

Hoje o acordar foi difícil. Ele é que fez uma Maratona, e eu é que tenho a sensação de ter sido atropelada por um camião.

Talvez seja das dores de dentes. Ou da sua ausência. Já que o que me dói é o vazio deixado pelo dente que arranquei na sexta-feira.

Não consegui dormir em condições, o que seria bastante razoável, depois de ontem ter acordado antes das seis da manhã. Eu nasci para dormir. Eu preciso de dormir. E, se não durmo, não funciono.

Acordei cansada, (ainda mais) rabugenta, desanimada e deprimida.

Ontem ao final do dia tomei uma decisão importante. Havia uma pequena esperança de uma grande mudança na minha vida em breve, mas ontem eu disse adeus a essa esperança. Ontem, no rescaldo da Maratona dele, pus-me a fazer contas à vida e decidi fechar uma porta. Talvez se abra uma janela, já diz o cliché. Mas eu não gosto de clichés, nem neles acredito. Acredito no que é racional. E ontem fui racional.

Talvez por isso tenha acordado assim. Pesada, no espírito e no corpo. Com o semblante carregado e a barriga inchada, reflexo dos abusos do fim-de-semana. Ele é que ia correr, mas eu fui solidária na ingestão dos hidratos. Ou talvez tenha tentado encontrar nos hidratos o consolo que não encontro na vida.

Faltam dois meses para o final do ano. E isso deprime-me. Cansa-me. Desanima-me. 



Ou então está tudo lindo, maravilhoso e fantástico na minha vida, e eu acordei mesmo foi com TPM.

domingo, 20 de outubro de 2019

Das fotografias que dão alegria... - Day 293


Dia de fazer de roadie na Maratona de Lisboa.

Em Cascais, em Carcavelos, na Cruz Quebrada e na meta.

A dar apoio ao louco mais louco do que eu (que fez uma prova incrível, ainda que ele diga que não), de dar apoio a colegas de equipa, de dar apoio a amigos e conhecidos, de dar apoio a perfeitos desconhecidos.




Para quem já viu ou fez provas lá fora (olhem para mim, a armar-me em atleta internacional...), é deprimente ver a falta de apoio que há nas provas em Portugal. No que depender de mim, hei-de sempre tentar contrariar isso. Porque já estive do lado de lá, e sei a diferença que isso pode fazer.

Foi uma manhã de Domingo incrível e daqui a duas semanas há mais. 

terça-feira, 15 de outubro de 2019

Das coisas que vale mesmo a pena partilhar...


Assinala-se este mês o mês de prevenção do cancro da mama, com muitas marcas a associarem-se às mais diversas iniciativas, para nos pôr a pensar sobre este tema, para nos alertar para a importância do diagnóstico precoce, para nos lembrar que não acontece só aos outros.

A CUF, com o seu Instituto de Oncologia, vai ter consultas de diagnóstico precoce, sob o mote "Proteja-se do Cancro da Mama". Estas consultas vão decorrer entre os dias 28 e 31 de Outubro, em 9 unidades CUF (de norte a sul do país), e são gratuitas para mulheres a partir dos 35 anos e para homens com alterações mamárias. E o que eu gosto de ver os homens incluídos na campanha, lembrando-nos que este mês não é só para as mulheres?

E vocês, quando foi a última vez que apalparam as vossas mamas?

segunda-feira, 14 de outubro de 2019

quinta-feira, 10 de outubro de 2019

Dos Ornatos Violeta...

Diz que vem aí um concerto dos Ornatos Violeta. Diz também que vai ser no Porto. Diz ainda que vai ser num dia em que calha estarmos no Porto! 

A pessoa que não estava convencida em ir passar o fim-de-semana da Maratona ao Porto, talvez agora esteja grata pela minha insistência desde aquele fim-de-semana na Serra Amarela.

Claro que fui a correr comprar os bilhetes (felizmente, trabalho a 150 metros da FNAC mais próxima), que já estão esgotadíssimos entretanto. 

Não me lembro ao certo de quando comecei a ouvir Ornatos... Mas lembro-me de vários momentos da minha vida, marcados pelas músicas deles.

Tenho passado os últimos dias a ouvir Ornatos no escritório, e dou por mim a cantarolar e a voltar a esses momentos. Quem nunca cantou "Ouvi dizer que o nosso amor acabou, pois eu não tive a noção do seu fim?", achando que a letra foi escrita a pensar em si?... Eu sei que, há precisamente 4 anos atrás, achava que sim. 

Não tenho dúvidas de que vai ser mais um grande concerto, a juntar à lista daqueles que já vimos juntos. Talvez um dia escreva a nossa história, com base nos espectáculos que já vimos juntos... Sei que coleccionamos bilhetes e além dos dos Ornatos, já temos ali bilhetes para mais um festival e dois concertos nos próximos tempos. 

Somos os dois forretas e muito ponderados a gastar dinheiro. Mas não resistimos a um bom concerto. Ou a uma boa corrida, já agora. 

quarta-feira, 9 de outubro de 2019

Das fotografias que dão alegria... - Day 282


Raramente cumpro com a foto do dia. 
No Instagram a coisa ainda vai indo, 
aqui nem por isso. 

Talvez em 2020.

Das eleições...

Acho que nunca acompanhei tanto umas eleições como estas. Nem sei bem por que motivo, mas talvez por estar, de facto, preocupada com o que aí vem nos próximos anos. Algo me diz que não será nada de bom... Mas talvez seja apenas eu a ser pessimista.

A verdade é que li artigos e programas eleitorais, assisti a debates mais sérios e assisti ao "Gente Que Não Sabe Estar" (mais relevante do que se possa imaginar, e a única altura em que dou audiência à TVI), tentei informar-me o mais possível, apesar de o meu voto já estar relativamente decidido há bastante tempo.

Por curiosidade, experimentei uma daquelas "Bússolas Eleitorais", que não me deu novidade nenhuma.

E Domingo lá fui votar. Porque não via outra opção que não essa.

Estas eleições (ou os seus resultados) surpreenderam-me a vários níveis. Alguns mais óbvios, outros menos.

A abstenção continua a surpreender-me. E vai surpreender-me sempre. Não entendo. A sério que não entendo quem tem a possibilidade de ir votar, de mostrar a sua opinião, de expressar o seu desejo, e opta por não o fazer. Quem opta por se desresponsabilizar do que se passa no país. Não entendo. Não é por mal. E se houver por aí alguém que me queira tentar explicar, a caixa de comentários ou a de email estão à disposição. Porque eu gostava de conseguir perceber.

A vitória do PS não me surpreendeu. Obviamente, não me surpreendeu. Preocupou-me, mas não me surpreendeu.

O que também me surpreendeu foram os três novos partidos com assento parlamentar! Escusado será dizer que o facto de o Chega ter conseguido um deputado me surpreendeu e preocupou. Que país é este que quer um partido destes no Governo? Mais uma vez, aceito quem me explique... Já a eleição de um deputado do Iniciativa Liberal e uma deputada do Livre, a que se juntam mais deputados do PAN, é algo que vejo com muito bons olhos. Ainda que a deputada do PSN por Setúbal saiba menos do programa eleitoral deles do que eu, mas é o que temos... 

Precisamos de mais diversidade no parlamento. Precisamos de novas ideias, de sangue novo. Independentemente de concordar com muito ou pouco do que cada um destes partidos defende, acho que é bom que o poder não esteja tão concentrado nos dois do costume. Há muitos países por essa Europa fora em que os dois maiores partidos têm menos poder, estando o mesmo mais distribuído por partidos mais pequenos, o que acaba por resultar.

Estou curiosa para ver o que aí vem. Já há quem diga para se reservarem as suites do Ritz para os amigos da Troika voltarem... Espero que não, mas acredito que seja uma possibilidade. 

Espero mesmo estar enganada. Espero mesmo que estas novas presenças em São Bento consigam abanar as águas, por pouco que seja. Espero que este país se endireite, e possamos ter a qualidade de vida que merecemos. Ou será que não merecemos? É que olhando para a taxa de abstenção, tenho as minhas dúvidas...

segunda-feira, 7 de outubro de 2019

Do meu estado actual...

Tenho no dia de hoje um lembrete no calendário do telemóvel que diz apenas e só "Inscrição São Silvestre".

Ora, eu não faço ideia a que é que isto se refere... 

Dado que já estou inscrita em duas (Lisboa e Corroios), que da dos Olivais ainda não se sabe nada, e que não me lembro de mais nenhuma assim de repente, venho por este meio solicitar sugestões de São Silvestres para me inscrever... Talvez se faça luz neste pequeno cérebro e eu me lembre por que raio tenho este lembrete.

(isto anda tão bom que eu já só funciono com o telemóvel e a respectiva agenda para combinar o que quer que seja, mas, pelos vistos, nem assim...) 

De Chamonix VI... - Tramway du Mont-Blanc, Brévent e a partida do UTMB...

Sexta-feira era o nosso último dia útil em Chamonix, dado que no Sábado tínhamos de ir para Géneve pela hora de almoço.

Sexta-feira era também o dia do pós-prova dele, pelo que queríamos um dia relativamente calmo, só mesmo para acabar de aproveitar o que ainda não tínhamos visitado.

Começámos o dia a tomar um pequeno-almoço numa padaria perto da casa da Heidi, por onde costumávamos passar e víamos sempre cheia. Rapidamente percebemos o motivo.


De barriga (bem) cheia, fomos até Saint Gervais (nos 850 metros de altitude), onde íamos apanhar o Tramway du Mont-Blanc, para fazer o seu trajecto na quase totalidade, já que na terça-feira tínhamos feito apenas uma muito pequena parte entre o Col de Voza e Bellevue. Agora, iríamos até ao Nid d'Aigle, nos 2380 metros.


O percurso demora cerca de uma hora, é sempre a subir, e tem partes verdadeiramente inclinadas e assustadoras

Mas é incrivelmente bonito! Vamos por ali acima, vamos vendo o vale cada vez mais pequeno lá em baixo, e à nossa volta as paisagens são incríveis!






Lá de cima saem, como sempre, muitos e variados trilhos, que devem ser incríveis, mas que terão de ficar para uma próxima oportunidade... Há um trilho que desce junto ao Glacier de Bionnassay (aquele que vêem atrás de mim na foto acima), que deve ser verdadeiramente espectacular! Ficou na lista, para ser feito um dia... 

Depois de uma volta para ver as vistas, voltámos a apanhar o tram para descer tudo outra vez.


Fomos em direcção a Chamonix, onde fomos almoçar a um sítio absolutamente decadente: o Cool Cats, um sítio muito trendy, de cachorros quentes artesanais, com mil opções, cada uma mais gordurosa do que a anterior...



Eu optei por um com salsicha vegetariana e... Ovo estrelado! Nunca tinha visto, muito menos comido, um cachorro quente com ovo estrelado. Mas, afinal, é possível!

Depois disto, restava-nos o último passeio: queríamos subir o teleférico até Planpraz (nos 2000 metros), e aí apanhar outro que nos levaria até Brévent (nos 2525 metros). Esta subida era do lado do Grand Balcon Sud, do mesmo lado onde tínhamos andado Domingo, e de onde teríamos vista para o Mont-Blanc e o Aiguille du Midi. Teríamos... Se o tempo o permitisse.




A subida até Planpraz foi tolerável, mas meio assustadora... O facto de o tempo não estar grande coisa, não ajudava, mas vimos muitos loucos a subir pelos trilhos a pé, mesmo por debaixo do teleférico, numa subida terrivelmente inclinada.



Subimos até Brévent, de onde a vista para o vale era incrível, e começámos a ver o tempo a piorar cada vez mais. O Mont-Blanc estava tapado, e tínhamos a clara sensação de estar no meio das nuvens, que parecia que estavam mesmo ali ao nosso lado...


Alguém andou todo o dia a passear o seu boné de finisher do OCC...




Não cheguei a perceber bem porquê, mas em Brévent senti-me verdadeiramente desconfortável. Estávamos numa altitude bastante elevada, com grandes escarpas à nossa volta, eu não me sentia segura, o tempo estava cada vez pior, e à minha volta só via dezenas de corvos. A sério. Eu só me lembrava do filme do Hitchcock. Estava mesmo a sentir-me mal e acabámos por não ficar lá muito tempo.




Nas duas imagens anteriores, uma fotografia de um mapa que lá estava e a fotografia real do que se via dali, dá para perceber bem o caminho que tínhamos feito na segunda-feira, do Plan de l'Aiguille até Montenvers e ao Mer de Glace, no Grand Balcon Nord.


Foi giro ver o outro lado do vale, que foi, mas eu só queria mesmo sair dali. Apanhámos o teleférico até Planpraz, e depois o outro teleférico até lá abaixo, e durante esse percurso começou a chover imenso e começaram também trovões... Mal saímos do teleférico, abrigámo-nos debaixo de um telheiro, porque estava a chover mesmo muito. Poucos minutos depois, pararam o teleférico. Pararam-no, simplesmente. Com pessoas lá dentro! Eu só imaginava o que seria se tivéssemos apanhado o teleférico uns minutos mais tarde e o tivessem parado connosco lá dentro, no meio de chuva e trovões... A sério. Eu não nasci para estas coisas!...

Eventualmente, a chuva acalmou, e fomos em direcção a Chamonix, porque queríamos assistir à partida do UTMB.



Que mar de gente! Que emoção! Que loucura! Tanta gente, de tantos países, com tantos objectivos e sonhos diferentes... Em Chamonix só se respirava UTMB. Em toda a parte atletas, apoiantes, habitantes e visitantes, toda a gente focada no início da prova. Quisemos encontrar um sítio para assistirmos ao início da prova, e nem isso foi fácil. As ruas estavam completamente cheias de gente! Eram corredores infinitos de pessoas a bater palmas e a gritar palavras de incentivo. Nunca tinha visto nada assim!


Foi muito bom assistir a esta partida, bater palmas a todos aqueles heróis, e ficar ali a torcer por eles, para que pudessem chegar ao fim daqueles 171km.



Saímos de Chamonix de coração cheio, com um pequeno abastecimento de macarons, e voltámos à casa da Heidi.

Neste dia jantámos com a minha amiga porto-riquenha e a sua filha (que também foi finisher do OCC!), e acabámos por ficar horas na conversa, até sermos (literalmente) expulsos do restaurante. É incrível como a corrida nos aproxima de pessoas da outra ponta do mundo, e podemos estar horas a trocar experiências de provas, de vida, de viagens... Ficou o convite para virem a Portugal, quiçá, participar em alguma das nossas provas!

Fomos dormir, já bem tarde, e já com saudades de Chamonix...

sábado, 5 de outubro de 2019

De Chamonix V... - O dia do OCC...

E chegámos ao dia do OCC. Dia 29 de Agosto (dia curioso, já agora).

Acordámos cedo. Muito cedo. Mas podíamos ter acordado bem mais cedo se no dia em que chegámos a Argentière não tivéssemos visto isto:


Então o autocarro do OCC pára em Argentière às 5h45?! Então por que raio vamos nós apanhá-lo às 5h15 a Chamonix, tendo de sair de casa às 4h30?... Toca de enviar email para a organização, a dizer que não tínhamos percebido que havia essa possibilidade e que, por isso, tínhamos reservado lugar no autocarro que saía de Chamonix, pedindo (e implorando) que nos deixassem trocar. Claro que deixaram! E nós respirámos de alívio. E dormimos mais uma hora!

O autocarro que ia para Orsières (na Suíça, onde começava o OCC), parava mesmo em frente à nossa casa da Heidi. Mesmo. Não podia ser mais perfeito. Perto da hora lá fomos nós, e já estavam mais uns quantos loucos à espera do autocarro que nos ia levar a todos ao ponto de partida daquela pequena grande loucura.


A viagem, de quase uma hora, foi feita maioritariamente em silêncio, com algumas pessoas (em que talvez eu estivesse incluída) a tentar dormir um pouco. O dia ia ser longo, e a noite tinha sido curta. 

Chegámos a Orsières e já havia muita gente por toda a parte a fazer tempo para o início da prova. Uns a descansar na relva, outros nos últimos preparativos, mais alguns a fazer um reforço alimentar, e muitos na fila para a casa-de-banho, como é habitual antes de qualquer prova.


O ambiente era curioso. Não sei bem descrevê-lo mas era um misto de excitação, com nervosismo, com emoção. Aquela gente toda não se conhecia, mas ali era toda igual. Atletas e apoiantes, todos juntos, todos a partilhar aquele momento.



O início da prova era numa pequena praça, e lá nos conseguimos posicionar. Eu consegui ficar ao pé dele durante um bocado, mas acabei por me ir pôr junto à meta, para vê-lo partir. Última despedida. Últimas fotos. Uma emoção tremenda. Sabia que ele estava preparado e não duvidava que ele ia fazer uma grande prova. Mas sabia que ele não estava tão confiante como eu. Pudera. Ele é que ia correr!...



Às 8h15 foi dado o sinal de partida. Fiquei ali a ver aqueles 1605 atletas a começar a sua prova. A perseguir um sonho, um objectivo. Impossível ficar indiferente. 


O que os esperava!

Quando todos se foram embora, correndo em direcção às montanhas, e aquela pequena praça que minutos antes estava repleta de gente ficou vazia, também eu me senti estupidamente vazia. Ou cheia, não sei bem. Senti um aperto tremendo e só queria chorar. Estava na Suíça, sem dados no telemóvel, sem ter com quem falar. Ele tinha acabado de partir para a prova mais dura que algum dia fez e eu estava ali, a sentir-me perdida e desorientada, depois de uma descarga tremenda de adrenalina, sabendo que ainda ia passar muito tempo até ter notícias dele (sem dados na Suíça, tínhamos combinado que ele não me ia dizer nada nas primeiras horas e eu ia apenas seguir o acompanhamento ao vivo da prova...).

Andei ali meio perdida e fui em busca do autocarro que me ia levar ao primeiro ponto de passagem onde eu o poderia ver: Trient, ainda na Suíça, já nos 25km de prova. Aproveitei o Wi-Fi momentâneo e troquei algumas mensagens com quem, em Portugal, já estava a acompanhar a prova. Acabou-se o Wi-Fi e começou a viagem até Trient, que foi relativamente rápida.

Cheguei a Trient ainda não eram 9h30 e sabia que ele devia chegar por volta das 12h50, mas ia depender muito de como a prova corresse até aí. Na véspera ele tinha-me dado um Excel que tinha feito, onde tinha posto o tempo estimado de passagem em cada ponto, em função do ritmo que ele previa fazer, para eu me ir guiando e saber mais ou menos o que esperar. 



Ao chegar a Trient, mais uma vez, confirmei que a malta do UTMB não brinca. Havia uma tenda gigante montada para os apoiantes, com mesas e bancos corridos, com um bar com comida e bebida, com uma televisão que ia passando vídeos em directo e informação da prova, com tomadas e... Wi-Fi gratuito! Voltei a estar em contacto com o mundo e comecei a preparar-me para as horas de espera que tinha pela frente. 



Felizmente, fiz rapidamente uma amiga: uma porto-riquenha que vive na Califórnia, e que estava ali a acompanhar a filha. Acabou por ser bom ter companhia, fomos falando e trocando experiências, e o tempo foi passando. Não faltava animação por ali, incluindo um grupo de miúdos de uma escola, e respectiva professora, que tinham muitos e variados instrumentos e faziam toda uma festa!


Através do site do UTMB e da app da prova consegui ver que ele passou em Champex-Lac (o primeiro ponto de controlo) abaixo do tempo previsto, e em La Giète a mesma coisa, apesar de ter perdido algumas posições na subida. A primeira grande subida estava feita, e só faltavam mais duas. Acabou por me aparecer em Trient bem mais cedo do que era suposto, o que me levou a recear que estivesse a ir depressa demais, e que depois iria pagar essa factura...

[Ainda o tentei convencer a escrever ele o relato da prova, mas ele não quer, portanto o máximo que posso fazer é tentar descrever o que ele me foi transmitindo.]

Ele chegou a Trient animado, mas preocupado com o estômago que não estava a colaborar. Sentia-se com o estômago pesado e cheio, e a coisa não estava fácil... Claro que eu fiquei preocupada e a pensar no que viria aí... Mas, felizmente, ele fez uma nova melhor amiga: a água com gás. Tornou-se um pequeno vício, a que ele não disse que não em todos os abastecimentos daí em diante. 


Naturalmente, os acompanhantes não podiam entrar dentro da tenda do abastecimento, mas ainda trocámos umas palavras (e uns beijos!) antes e depois, tirei-lhe umas fotos e despedimo-nos. Estava quase metade da prova feita, ainda que ainda faltassem muitos e longos quilómetros... Acima de tudo, fiquei mais tranquila, porque aquela coisa de estar mais de 4 horas sem saber dele, a tentar adivinhar como a prova estaria a correr, não era para mim... 

Lá foi ele em direcção à segunda grande subida (até aos 2100 metros), e lá fui eu apanhar outro autocarro, em direcção a Vallorcine, onde terminava a grande descida depois da grande subida.

Mais uma vez, tudo super bem organizado, imenso apoio na rua, uma verdadeira festa! Aí já estávamos em França, e já foi mais fácil para mim comunicar com o Mundo e partilhar novidades. Foi muito bom sentir que havia tanta gente a torcer por ele, a acompanhar a prova e a mandar-me mensagens. Sempre que estive com ele, tentei dizer-lhe isso mesmo, para lhe passar algum ânimo (não que ele precisasse).

Fui acompanhando na app, e vi que, mais uma vez, ele perdeu imensas posições na subida... Estava com medo que o estômago tivesse voltado a fazer das suas, ou que ele estivesse a rebentar (estava sol e bastante calor). Mas a verdade é que ele chegou a Vallorcine dez minutos mais cedo do que o planeado, e vinha super animado e bem-disposto. A prova estava a correr bem, apesar de muito dura, e ele estava a adorar.

Eu juro que aqueles 5 minutos em que estive com ele de cada vez, valiam bem pelas horas de espera, só por o ver tão animado! Isso e pelos chocolates que ele andou a roubar dos abastecimentos para me trazer... Quem é que se lembra de tal coisa!? O louco...


E lá foi ele outra vez...

Sempre que ele se ia embora, eu ficava meio tonta, com aquele sorriso parvo de quem está a partilhar uma coisa tão feliz e especial, ao mesmo tempo que sente um orgulho tremendo...

O próximo abastecimento seria em Argentière, já com 44km de prova, e muito perto da nossa casa da Heidi.

A dada altura começou a chover... A chover bastante... Aqueles pingos gordos que chateiam... E eu preocupada com ele, lá no meio da montanha, já com 40km em cima, e ainda a levar com chuva...

Mas não sei o que é que lhe deu, que o homem ganhou fogo nos pés e começou a despachar-se pela montanha fora! Entre Les Tseppes (quase no topo da subida grande) e Argentière, ele ganhou 150 posições! E eu tola, a ver aquilo... A achar que ele tinha ensandecido ainda mais. Não é que ele ligue alguma coisa a isso... Ele é um corredor de meio da tabela. Às vezes, melhor, às vezes, pior. Mas a verdade é que os problemas de estômago tinham ficado para trás, ele estava super entusiasmado e a sentir-se bem. Só me contava que as subidas estavam a correr muito melhor do que esperava, e que aquilo era espectacular.


Argentière já estava. Faltava a última grande subida até La Flégère, e depois era sempre a descer até Chamonix. Faltavam 12 quilómetros! Para o bom e para o mau, a última grande subida coincidia em boa parte com o trilho que tínhamos feito no Domingo, que saía de Argentière a subir. Acho que psicologicamente o ajudou, sobretudo nesta fase, já saber o que aí vinha, já conhecer o percurso, o tipo de terreno e o que o esperava. Despedi-me dele mesmo no sítio onde começava o trilho que tínhamos feito, com um "Vemo-nos em Chamonix! Até já!".

Entretanto, ainda fui à casa da Heidi, porque nessa manhã tinha descoberto que o chuveiro estava avariado... Ora, o homem ia chegar do OCC e a última coisa que eu queria era que ele ficasse sem tomar banho!... Já imaginaram o que seria?!... Pois que lá consegui que fossem lá trocar as torneiras da banheira, e só olhava para o relógio e dizia ao coitado do rapaz que estava a fazer a reparação que tinha de me despachar, que tinha de ir para a meta em Chamonix! Num dia cabe mesmo muita coisa, certo?...

Chuveiro operacional, e lá vou eu em direcção a Chamonix.

O ambiente estava incrível! As ruas cheias de gente, uma festa imensa, barulho por toda a parte... É impossível ficar indiferente ao que se vê ali e às emoções no rosto de cada atleta que corta aquela meta... Tal como em todos os abastecimentos, fiz sempre uma festa enorme sempre que vi um português. Não eram muitos, mas eram bons (tivemos um 7º lugar e tudo!).


Eram 18h28 quando ele cortou a meta. Quase 40 minutos mais cedo que a previsão que ele mesmo tinha feito inicialmente. Fez uma segunda metade da prova absolutamente incrível, sempre a ganhar posições, sempre num bom ritmo e, acima de tudo, a sentir-se bem. Que orgulho, caramba! Foi o 629º atleta a cortar a meta, de 1474 finishers. Um resultado muito melhor do que ele esperava. Mas dentro daquilo que eu esperava, porque sabia bem o que ele tinha treinado...

Gostava mesmo que fosse ele a contar como lhe correu a prova, mas vão ter de se contentar com a minha versão.

E o que eu posso dizer é que foi um dia incrível, de mil e uma emoções, em que não parei um minuto, porque andei sempre de um lado para o outro, e quando estava em algum lado à espera dele, aproveitava sempre para mais uns aplausos, mais umas palavras de incentivo. Não foi, de todo, um dia chato ou de tédio... Foi um privilégio fazer parte de algo assim, e nem imagino o que seja um CCC ou um UTMB... A sério. Foi um dia mesmo muito emotivo, e que nunca esquecerei. Não só pelo que representou para ele, em termos de superação e de objectivo alcançado, mas por tudo o que vi e vivi.

Próximo passo... CCC? Pode ser que sim!

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