Sábado era dia de treino longo. E foi. Mais ou menos.
Devia ter feito 25km. Idealmente, 27km. Mas fiz apenas 22km. Que me custaram horrores, naquele que foi o treino mais duro que fiz nesta minha jornada a caminho dos ovos moles... Quando a cabeça não quer e os pés não ajudam, as pernas não correm. Foi esta a lição do dia.
Tive um jantar com colegas de trabalho na sexta-feira e acabei por me deitar mais tarde do que devia. Quando o despertador tocou às sete no Sábado, eu só me queria virar para o outro lado e dormir. Ou chorar. Também me apetecia chorar.
A muito custo, lá me levantei. Despachei-me e saí de casa. Talvez tenha apanhado uma multa pelo caminho (ia de carro, não a correr... Não se entusiasmem!). Cheguei ao ponto de encontro do Treino Longo do Correr Lisboa já atrasada. Não fazia diferença. Seria sempre das últimas.
E fui. Comecei a correr, sem vontade alguma, no meu ritmo lento quase parado. Ao fim do primeiro quilómetro percebi que havia três outras corredoras que iam a um ritmo semelhante ao meu, e perguntei-lhes se me podia colar a elas. E colei-me. Soube bem a companhia nos primeiros quilómetros até ao abastecimento. Ia a um ritmo simpático, sentia-me bem e a coisa parecia que, afinal, não ia ser tão dramática como eu previra quando saíra de casa. Ou julgava eu.
Depois do abastecimento (abençoado!), ainda tive companhia até ao Terreiro do Paço, de uma atleta que depois ia subir pela Baixa e pela Avenida, para regressar a casa a correr. Ela morava em Telheiras. Logo ali, portanto.
Feitas as despedidas, decidi voltar para trás, porque se continuasse mais para a frente, já não ia a tempo de apanhar o abastecimento no regresso. E foi quando voltei para trás que percebi que o treino não ia mesmo ser fácil. O vento contra foi impedioso comigo. Nem os quilos a mais que tenho me ajudaram, e eu achei que ia voar a qualquer momento. Foi uma luta grande entre mim e o vento, e os metros teimavam em não passar.
Mas lá fui. Um pé depois do outro. Cheguei a pôr a hipótese de chegar ao abastecimento e pedir boleia de carro. As dores na coxa tinham começado aos 9km, o vento estava a irritar-me e eu comecei a achar que aquilo não era para mim.
Mas, claro, cheguei ao abastecimento, com 12km e qualquer coisa, e limitei-me a beber água e isotónico, pegar num gel para o caminho, e seguir viagem. Uma pessoa pensa muito em desistir, que pensa, mas até para desistir é preciso coragem, e isso é coisa que não abunda por aqui.
Segui viagem. A sofrer. Com os pés a começarem a acusar as bolhas e respectivas dores. Aquela parte entre Santa Apolónia e o Poço do Bispo é terrível. Estrada de um lado, contentores do outro. Eu, só e abandonada. O vento contra. A cabeça começa a falhar. Volto a pensar que aquilo não era para mim. Lá porque fiz uma maratona, quem é que eu me julgo para achar que faço outra? Não faço. Não quero fazer. Estou farta de tudo. Começo a deixar de conseguir respirar e sinto os soluços a formarem-se na garganta. Antes de largar num choro compulsivo, decido parar de correr, ir simplesmente a caminhar, e recorrer à ajuda telefónica do público. O louco mais louco do que eu, lesionado e fechado em casa, dá-me palavras de ânimo. Diz-me que estou quase na Expo e que só preciso de fazer mais 5 ou 6km para chegar ao carro. Acalmo-me. Desligo e volto a correr.
Vou tentando definir pequenas metas para me ir motivado. Agora até ao Prata. Agora até ao bebedouro no parque infantil da Marina. Páro. Alongo para tentar aliviar as coxas. Tomo um gel, convicta de que não posso fazer apenas os quilómetros que me separam do carro. Volto a correr. Só até ao Pavilhão de Portugal. Caminho 100 metros. Já ia com 17km. Precisava de fazer mais.
Volto a correr. Primeiro, decido fazer 20km, que devia ser o suficiente para chegar ao carro. Depois, penso que 20km é pouco. Passo pelo carro e decido seguir, para fazer os 21km. As dores são muitas mas eu penso que 21km já fiz mais do que uma vez. Preciso de fazer mais. Decido fazer os 22km, só para fazer mais do que nas outras vezes.
E fiz. Não sei como, mas fiz. Curiosamente, mesmo com algumas partes a caminhar pelo meio, fiz um ritmo médio perfeitamente alinhado com o que tenho feito ultimamente (6'27/km). E o meu quilómetro mais rápido foi o último (6'04). Não deixa de ser irónico constatar que o meu corpo dava para mais. Que eu sei que dava. A cabeça e os pés é que não.
Este foi o meu treino mais longo até agora. O que, a quatro semanas menos um dia da Maratona, é uma miséria. Eu sei.
Mas também sei que se no dia 28 eu não conseguir fazer aqueles 42km, esta preparação já valeu a pena por tudo o que me tem ensinado e pelas dezenas de euros que tenho poupado em terapia.
"Uma pessoa pensa muito em desistir, que pensa, mas até para desistir é preciso coragem, e isso é coisa que não abunda por aqui."hmmm, e a coragem necessária para continuar?
ResponderEliminarEu também odeio correr contra o vento, só é pior andar de bicicleta contra o vento.
Foi também nestas questões de "contra o vento" que evoluí na arte do impropério interno e mental, só eu é que me ouço...
Pelo que li foi um excelente treino, treinaste o cardio e a resiliência.
Dizem que é importante quando se correm distâncias para as quais inventaram já um sei lá numero de veículos para tal.
Para continuar não é necessária coragem. Uma boa dose de insanidade é suficiente!
EliminarEu também estou profissional na arte do impróperio... Sem dúvida!
Por que raio insistimos nisto de fazer a correr, o que podíamos fazer de carro?...
21 km dão para pôr muitas "conversas internas" em dia...
ResponderEliminarForça!!!
Foram 22!!! Tu não me roubes um quilómetro que me custou tanto a fazer... Ahahaha :D
EliminarGrande treino!!! Muitos parabéns! A sério .. treinaste tudo o que é preciso na Maratona.. distância, abastecimento, resiliência, paciência, sofrimento e utilizar diferentes tácticas conforme o que ias sentindo. Treino perfeito!!! São estes treinos que te dão conhecimento do teu corpo para o que vem aí. Sigaaaa…. :)
ResponderEliminarAdoro o teu entusiasmo :D
EliminarQuando precisar de energia positiva, já sei com quem falar!
Sim, foi um treino com coisas positivas. Mas está longe do que devia ter sido, e custa lidar com isso!
Obrigada e bons treinos :)
Uau, tem calma! Foi só um dia mau, não leves isso tão a sério! Um treino não faz a maratona, ainda por cima até foi bom! Repito, tem calma, não leves a corrida tão a sério. Não é normal apetecer chorar antes de um treino, é suposto ires ter um bom momento. Não penses nisso como uma coisa critica, eu sei que durante é um sofrimento, mas foca-te na recompensa. Se correr mal, corre mal. Há outros dias para treinar! A corrida é só mais uma coisa que fazes, não deves nada a ninguém nem tens que justificar nada. Tens é que ter prazer no que fazes. Parece que estás a meter demasiada pressão em ti própria e isso incapacita-te. Vá, bora lá, hoje também é dia, calça as sapatilhas logo ao fim do dia e dá uma voltinha!
ResponderEliminarO querer chorar antes, durante e depois do treino, tem a ver com o meu estado mental que não anda brilhante... E sem a cabeça em ordem, fica difícil correr.
EliminarEsta preparação está a ser muito diferente do que era suposto, e eu vivo dividida entre tentar dar o máximo para correr por aqueles que não o podem fazer, e entre não ter vontade de o fazer por não ter ao meu lado os que era suposto ter.
É o carrossel de emoções de que o João Lima costuma falar, a que se junta a minha veia de drama queen :)
Amanhã já passa, eu sei... Na quarta-feira o treino correu super bem e eu sentia-me a maior. Quinta foi miserável. Sábado ainda mais miserável. Mas o próximo será melhor, certamente. E eu hei-de voltar a sentir-me a maior.
Obrigada, Filipe. Pelas palavras e pelo ânimo!
"Esta preparação está a ser muito diferente do que era suposto, e eu vivo dividida entre tentar dar o máximo para correr por aqueles que não o podem fazer, e entre não ter vontade de o fazer por não ter ao meu lado os que era suposto ter." - Miúda, foram umas lindas rimas mas por mim só precisas de correr os mesmos 42,195m que vais correr por ti, nem mais um metro ok? Só para esclarecer! :P
EliminarAhahahah! Ficou esclarecido :D
EliminarCom essa capacidade mental, o infinito é o limite.
ResponderEliminarMuitos parabéns, "fibra" dessa é raro.
MIKE
Happyrun
Olha, nem sei o que dizer... Obrigada, acho! Numa forma estranha e contraditória, foi a capacidade mental que me faltou Sábado. Mas também foi a capacidade mental que me fez não desistir. Acho que não dá para ser mais bipolar que isto.
EliminarBons treinos :)
A cabeça começou a derrotar-te mas foi também a cabeça que te levou a continuar. E isso, foi uma grande mais valia no treino, o treino mental.
ResponderEliminarForça! Tu vais conseguir!!!!
Beijinhos
Vamos ver, vamos ver!
EliminarUm beijinho, João. Obrigada pelas palavras!
Miúda gira, foi só um treino que correu menos bem...ainda assim: VINTE E DOIS QUILÓMETROS, não me gozes, é espectacular, sim, até para quem já fez uma maratona. Vamos lá, estou a torcer por ti!
ResponderEliminarObrigada, querida! Infelizmente, não é suficiente. Mas vamos ver.
EliminarUm grande beijinho!
Como diz a Andreia, fui apenas um treino com algumas condicionantes que no dia já não vais ter. Ainda assim, tenta ver o copo meio cheio com a tua conclusão do treino e olha que a zona de aveiro é bastante ventoso porque é a beira mar :)
ResponderEliminarAi, nem me fales nisso! Tenho de arranjar umas rezas para fazer a todos os santos...
EliminarTu és forte e determinada. Ou achas que não foi a força e determinação que te fizeram passar pelo carro e continuar?
ResponderEliminarVamos fazer isto juntas na mesma, tu de um lado e eu do outro, prometo que estarei sempre disponível, presencialmente em alguns pontos (se não conseguir a tal bicicleta) e por telefone sempre que quiseres (se não quiseres, obviamente, não atendes... E eu tento mais tarde! Ahahahah).
Vamos fazer da tua segunda maratona uma experiência memorável!
Acredita no que eu já tenho certeza! :)
Temos de ter uma conversa séria! Ahahahah!
EliminarOlha, logo se vê, sabes? Já nem sei o que dizer ou pensar... Dia 28 logo se vê. Sem pressões, sem expectativas.
Temos de combinar falar! Mesmo!