O tema da maternidade está, todo ele, envolto em muitas e variadas opiniões, que são, muitas vezes, extremadas e radicais. Isso, só por si, já me cansa. Pior ainda quando, na maior parte dos casos, as minhas opiniões não condizem com as da maioria.
Comecemos pelo princípio.
Para a larga maioria das mulheres, ser mãe é algo relativamente óbvio e natural. Para algumas, é mesmo algo com que sonham desde crianças. Para umas e outras, é algo que faz parte dos planos, do caminho natural da vida, dos passos que pretendem ir dando e dos objectivos que querem alcançar. Não conseguem sequer conceber a vida sem filhos. E está tudo bem.
Depois, há as outras. As que não querem ter filhos. As que não se imaginam com filhos. As que acham que também pode haver vida sem filhos. E já não está tudo assim tão bem.
Eu fiz parte do segundo grupo durante muitos anos. Nunca me imaginei como mãe, nunca pensei que as crianças fossem o melhor do mundo, nunca me derreti particularmente com bebés, nunca me senti "mãezinha", nunca achei que me faltasse essa peça na minha vida para ser feliz. Mas quis a vida que, um dia, eu mudasse de opinião, e eu passei a querer ter filhos. Mas essa foi a única coisa que mudou. Não baixou em mim todo um instinto maternal, nem passei a adorar criancinhas de um momento para o outro, ainda que possa vir a achar que a minha criança é o melhor do mundo (mas só a minha, sorry!).
Eu sou uma pessoa (relativamente) racional. Pouco emocional e fria, até, em algumas coisas. Calhou (ou não calhou porque fui eu que escolhi assim) ter ao meu lado uma pessoa igual ou ainda pior do que eu. Não era por acaso que, nos inícios da relação, eu lhe chamava cubo de gelo. Somos os dois assim, e está tudo bem.
Daí que, ao longo de toda a gravidez, eu tivesse dificuldade em lidar com perguntas como "estão super felizes?", ou afirmações como "aproveita a gravidez que é uma experiência única e vais ter saudades", ou ainda "ser mãe é a melhor coisa do mundo". Também é comum vermos e ouvirmos relatos de quem diz que amou os seus filhos desde o momento em que soube que estava à espera deles, num amor gigante e crescente. E eu, confesso, senti-me meio alien por não ter sentido isso. Na nossa racionalidade, a verdade é que acho que sentimos os dois dificuldade em criar relação com um ser que não víamos e que ainda não era bem real para nós. Até ao momento em que a Isabel nasceu, eu tive dificuldade em acreditar que ela era mesmo real, e tive dificuldade em sentir esse amor de que toda a gente me falava.
Também tive dificuldade em adorar a gravidez, mas já falámos sobre isso.
Agora, que a Isabel nasceu, eu continuo a sentir-me alien, por continuar a não me identificar com muitas das coisas que oiço e leio por aí. Não devia, mas fico a questionar-me se haverá algo de errado em mim, se não nasci mesmo para ser mãe, se terei algum defeito. Talvez daqui a uns anos se venha a descobrir que sim, que tenho, e já fica aqui o registo da minha consciência do facto.
Nestas 5 semanas (fez ontem!), eu já me afastei da Isabel algumas vezes. Três, se não estou em erro. Todas para ir ao médico e cerca de 2 horas de cada vez. Em momento algum eu me senti culpada ou preocupada. Não me custou, não fiquei a sofrer, não morri de saudades. A Isabel estava com a pessoa que, a par de mim, melhor pode cuidar dela. E eu não vi qualquer razão para estar preocupada. Mas fiquei preocupada por não ficar preocupada. O que é só parvo, mas é o que toda a pressão em torno deste tema me faz sentir.
Hei-de voltar a falar nisto, noutra perspectiva, mas confesso que é algo que me preocupa: não estar a sentir a maternidade como a generalidade das pessoas a sentem.
Também já me perguntaram coisas como "estás a adorar ser mãe?" ou "apaixonaste-te pela tua filha assim que a viste"?. E eu fico sempre na dúvida se dou a resposta verdadeira, ou a resposta politicamente correcta.
No caso da primeira pergunta, depende da hora a que me perguntarem. Neste momento, em que tenho a Isabel envolta no pano, em pele com pele, encostada ao meu peito, sem chorar há uma hora, e lhe vou dando beijos na testa enquanto escrevo este post, sim, estou a adorar ser mãe. Se me perguntarem às duas da manhã, quando ela berra desalmadamente, quando nada a acalma, e quando ninguém neste prédio dorme, talvez eu responda que não estou a adorar assim tanto.
No caso da segunda pergunta, não, não me apaixonei pela Isabel assim que a vi. Peço desculpa por isso, mas a verdade é que não acredito em amor à primeira vista (desculpem, não resisti!). A seu tempo, hei-de pôr aqui o texto sobre o nascimento dela, o que poderá ajudar a explicar isto.
No fim do dia, estou a adaptar-me a esta nova condição da minha vida, a esta nova realidade, a este novo ser que me desafia e apaixona em medidas (quase) iguais. E está tudo bem.