quinta-feira, 31 de maio de 2018

Da Maratona de Madrid... - VIII

Este é o último post sobre este tema. Acho. Mas nunca se sabe...


Depois do relato, depois de falar da prova em si, falta escrever sobre mim na prova. 

Claro que, tudo o que eu escrevo aqui, é muito pessoal, é totalmente empírico, e eu não sou exactamente muito experiente no tema para poder falar muito sobre o mesmo. Longe de mim querer achar que posso estar para aqui a falar de Maratonas como se fosse muito entendida! Só acho que, precisamente por isso, e até para minha referência futura, pode ser interessante partilhar a minha experiência de alguém que olha para isto de forma muito simples e terra-a-terra, apenas com base no que viveu e aprendeu. Também sei que, dado o tempo que eu demorei a concluir a Maratona de Madrid, talvez o que eu aqui digo não seja muito legítimo. Não é o mesmo fazer uma Maratona em três horas ou em cinco. Talvez não faça sentido eu falar na gestão da alimentação que fiz durante a prova, porque, de facto, eu fiz mais um passeio por Madrid do que uma prova, mas foi o meu passeio e quero falar sobre ele. O mesmo quanto à preparação antes... Ou quanto às cãibras, que não tive. Talvez se eu corresse o tempo todo e depressa, tivesse tido. Talvez correndo ao meu ritmo, seja impossível tê-las. Não sei. Mas posso partilhar o que fiz para evitar que as tivesse, caso fosse possível tê-las quando se correr a ritmo de tartaruga.

Mas avancemos.

A decisão de ir a Madrid surgiu no seguimento do fracasso que foi a tentativa de ir ao Porto. Quando, em Setembro ou Outubro do ano passado, decidi desistir de tentar estrear-me na Maratona do Porto, naquela que foi uma decisão dura e difícil, a primeira coisa que o louco mais louco que eu fez foi procurar outras opções em que eu me pudesse estrear. Ainda pensei em fazer outra até ao final do ano, mas acabei por ficar desmoralizada e sem vontade. Sevilha também foi considerada. Mas implicava treinar muito durante o Inverno, e eu conheço-me. Por outro lado, no final do ano começou a surgir a possibilidade de eu vir a ser obrigada a parar durante uns tempos e começaram a surgir também outros planos de futuro. Com isto, eu sabia que ou fazia já uma Maratona, ou talvez nunca a fizesse. A pouco e pouco, surgiu Madrid em cima da mesa. Era perto, era barato, calhava junto ao 25 de Abril, o que permitia fazer umas mini-férias, nenhum de nós conhecia bem a cidade, já estaria um tempo mais simpático, tinha imenso tempo para treinar, ... E foi assim que, no Natal, o meu presente para ele foi a inscrição na prova. Consequentemente, inscrevi-me a mim também, mesmo sem ter a certeza se poderia fazer a prova.

E foi a partir da inscrição, que eu comecei a treinar. Criei um plano de treinos no My Asics, a que já tinha recorrido noutras ocasiões e sempre gostei muito. As projecções muito optimistas diziam que eu havia de fazer a prova em 4h26. Desde o princípio, sabia que isso era impossível.

Foram quase 4 meses de treinos. Treinos pouco consistentes, pouco regulares, muito incertos. Devia treinar 4 vezes por semana. Acho que isso não aconteceu mais do que uma ou duas vezes. Regra geral, treinei 3 vezes por semana. Houve semanas em que treinei 2, houve semanas em que treinei 1. Não sou a pessoa mais disciplinada e focada do mundo. Nunca serei. Pelo meio, houve uma mudança de casa e muita coisa a acontecer na minha vida pessoal, na minha saúde, e nas pessoas à minha volta. Sei que devia ter treinado mais, mas sei que fiz o possível, enquanto tentava aguentar-me em pé e ter vida para além da corrida (isso existe?).

Em jeito de preparação, fiz o Fim da Europa, fiz o Peninha Sky Race e fiz a Meia de Cascais, em três semanas seguidas. Parecendo que não, acabou por ser um bom arranque para os treinos. Depois disso, fiz um treino de 22km e dois de 25km. Não fiz treinos verdadeiramente longos. E isso deixou-me em pânico para o dia da prova. Há muitas e variadas teorias sobre esta questão. Eu, que não percebo nada disto, acho que os treinos mais longos são importantes, sobretudo, a nível psicológico. Não sei se as nossas pernas sabem bem se corremos 25, 30 ou 35km. Mas a nossa cabeça sabe perfeitamente e pode cobrar-nos isso. Na semana antes da prova, pelos motivos que se sabe, fiz apenas dois treinos de 5km. Levei o conceito de tapering ao extremo. E parece que até nem foi má ideia.

Um mês antes da prova, e por causa das minhas amigas bolhas, comecei a pôr creme anti-bolhas. Em quantidades monstruosas. Todos os dias. Duas, três, quatro vezes por dia. De manhã depois do banho, ao fim da tarde antes dos treinos, depois do banho a seguir aos treinos, antes de dormir. Tornou-se o meu ritual religiosamente cumprido. E foi a única coisa que, de facto, teve algum efeito. Claro que fiquei com bolhas durante a Maratona. Mas nada que se compare com a bolha de sangue que fiz no primeiro treino de 25km. Na verdade, e é certo que já se passou algum tempo, mas não tenho grande memória de as bolhas me terem incomodado muito durante a Maratona (ao contrário do que aconteceu em Cascais, por exemplo). Tive mais dores depois, com muitas dificuldades em calçar-me nos dias seguintes, do que propriamente na prova. E também nunca tive os pés tão hidratados! Fica a dica, para quem sofra do mesmo mal.

Uma semana antes da prova, comecei a tomar Magnesona diariamente. Torço um pouco o nariz a suplementos da moda e aquelas coisas que a malta super fit toma. Mas a Magnesona vende-se na farmácia e é dada, por exemplo, às grávidas, e é, de facto, muito eficaz na redução das cãibras. Mal não faz, de certeza. E o que é certo é que não tive uma única! Se foi por correr devagar ou foi por causa disto, nunca saberemos...

Já se sabe que os dias antes da prova não foram o ideal em termos de alimentação e descanso. Mas tentei, dentro do possível, ir bebendo muita água, e no Sábado privilegiei os hidratos de carbono ao almoço (pasta party!) e ao jantar (italiano). O pequeno-almoço antes da Maratona foi o do costume: papas de aveia com leite de soja, mel e frutos secos, acompanhadas de chá verde. Antes da prova, comi uma banana e bebi mais água. 

Durante a prova, tomei 3 ou 4 géis (já não me lembro ao certo), e acho que 2 gomas (acho que já disse que sou fã destas). Nos abastecimentos, que eram bastantes, fui apanhando alguns pedaços de banana, mas poucos, que não me apetecia muito e o que eu queria mesmo era laranjas, que não havia... Quando havia isotónico e água, o que fazia era pegar numa garrafa de água e num copo de isotónico. Bebia logo o isotónico e depois ia bebendo pequenos golos de água. Umas das minhas maiores preocupações era com a desidratação, sobretudo, porque estava bastante calor. Fui-me obrigando a beber água, a pouco e pouco, e ia molhando a cabeça, a cara e os braços. O objectivo era beber uma garrafa de água entre cada abastecimento. Nem sempre o fiz, mas quase. E não, não tive de parar mais nenhuma vez para ir à casa-de-banho (tirando aquela logo ao início). Aliás, só muitas horas e algumas cervejas depois da prova é que voltei a ir à casa-de-banho. Desculpem estes pormenores, mas é mesmo incrível o impacto que uma coisa destas tem no nosso corpo!...

Psicologicamente, a prova foi toda uma montanha-russa. Houve vários momentos em que me perguntei por que raio estava ali. Houve várias alturas em que achei que aquilo não era para mim. Mas nunca, em momento algum, pensei seriamente em desistir. Mesmo no meio de todas as inseguranças, eu sabia que havia de cortar aquela meta, custasse o que custasse. Eu pensava em tudo o que tinha passado para chegar ali, eu pensava em tudo o que estar ali representava, eu pensava nas pessoas todas que tinha a torcer por mim, e eu sabia que tinha de acabar a prova. E acabei. Ainda não sei bem como, mas acabei.

Outra coisa que eu achei, e perdoem-me os que discordam, é que fazer a Maratona não custa assim tanto!... Fazer a Maratona é chegar e correr. Sim, eu sei que demorei quase 5 horas e que isso me tira alguma moral para falar mas é mesmo isto que eu sinto... O que custa são os meses e meses de treino, é o acordar cedo, é o ter de abdicar de jantaradas, é o estar sempre a condicionar a vida à volta do plano de treinos, é o estar preocupada com a alimentação, é a pressão tremenda de ter de treinar, são as dores e as recuperações... É isso que custa. É isso que nos faz vacilar. No dia? No dia é calçar os ténis e correr! No dia, é tentar absorver tudo o que está a acontecer para conseguirmos guardar em nós todas as memórias daquela experiência única! No dia é aproveitar e ser feliz! Só isso!

E como é que eu me sinto quase um mês e meio depois da Maratona? Sinto que não fiz uma Maratona. É verdade. E poupem-me as palmadinhas nas costas. Eu fui educada com base na premissa "nothing is good enough", pelo que, ter demorado quase 5 horas e ter feito uma parte do percurso a caminhar, não me permite reconhecer-me o direito de me sentir verdadeiramente maratonista. Eu fiz a Maratona, sim, e eu fiz o melhor que podia, sim, e custou-me muito, sim, e esforcei-me muito, sim, e foi um feito do caraças dadas as circunstâncias, sim. Mas talvez tenha de voltar a fazer uma a sério um dia, para a coisa me saber a sério. Não me batam, por favor!... Não consigo explicar melhor o que sinto, e sei que vou ser mal interpretada, mas entendam isto como mais um dos muitos disparates que eu por aqui digo. É um sentimento estranho. Eu fiz a Maratona, mas sinto que não me posso pôr ao mesmo nível de tantas pessoas que conheço (e que não conheço) que são Maratonistas a sério... É estranho, mesmo. Mas é o que eu acho!...

Por último, esta prova só foi possível porque tenho à minha volta gente incrível. Se não fosse o louco mais louco que eu, não teria conseguido. Não tenho dúvidas disso. Foi ele que me apoiou desde o início, foi ele que me obrigou a treinar, foi ele que refilou comigo quando eu me armei em lontra e quis ficar na ronha, foi ele que me incentivou e empurrou para a frente quando eu duvidei de mim, foi ele que me acompanhou em muitos treinos sofrendo no meu ritmo lento-quase-parado, foi ele que abdicou de fazer uma prova melhor no dia M apenas para poder partir comigo. Muito do que fiz, devo-o a ele. Mas devo-o também a muitas outras pessoas, muitas pessoas que estão aí desse lado, que também me deram dicas e conselhos, que me deram forças, que me incentivaram, que me apoiaram e acreditaram. E é uma sensação incrível sentir esse apoio! Quanto mais não seja, a Maratona valeu por isso! Obrigada!



E assim encerro este tema por aqui. Por ora.

quarta-feira, 30 de maio de 2018

Das confissões...

Se calhar, tens um problema quando a Senhora da Hussel não só já te conhece, como insiste para que comas um chocolate novo que ela lá tem para tu provares...

domingo, 27 de maio de 2018

Da forma como desperdiçamos o que nos é dado...

Um mês e nove dias. Um mês e nove dias foi exactamente o tempo que eu demorei a cair em mim.

A minha mãe morreu. A minha mãe morreu e a única coisa que eu fiz nos últimos anos foi ignorá-la. Foi deixar sem resposta os emails e as mensagens que ela insistia em enviar-me e que tinham até o dom de me irritar.

Agora já não vai haver mensagens nem emails para ignorar. Nem para responder, quisesse eu mudar de ideias.

Agora já não vai haver nada. Porque ela morreu.

Ela morreu e eu percebi agora que vou viver para sempre com a culpa, com a dúvida, com a incerteza. Ela morreu e eu não sei se fiz tudo o que podia. Ela morreu e eu não sei se dei todas as oportunidades que devia ter dado. Talvez pudesse ter dado mais uma. Talvez devesse ter dado mais uma.

Agora não há nada a fazer. Agora é clara para mim a irreversibilidade da morte. É clara como se nunca tivesse sido. Achamos sempre que a morte é uma coisa distante, que acontece aos outros, que acontece aos que são muito velhinhos, que vai acontecer um dia mas nunca pensamos muito bem em quando será esse dia. Depois a morte começa a fazer o seu trabalho. Leva-nos uma pessoa, e outra, e outra. E nós percebemos que a morte é mesmo inevitável. E mesmo irreversível.

E a morte traz consigo lições. Muitas e variadas. A morte obriga-nos a pensar e repensar no que fizemos em vida. Porque o que não fizemos, já não vamos fazer. E isso é uma grandessíssima merda. Esta coisa de as pessoas morrerem sem aviso prévio, sem nos darem tempo para pensarmos bem se fizemos tudo o que queríamos ter feito, é uma grandessíssima merda.

Ou então é só (mais) um murro no estômago para nos lembrar que o nosso tempo por aqui é finito. E, pior do que isso, é incerto. Não sabemos por quanto tempo vamos por cá andar, nem sabemos por quanto tempo cá vão andar os que nos rodeiam. Talvez seja boa ideia deixarmo-nos de merdas e aproveitarmos a vida que temos. Só talvez.

Porque um dia é tarde demais. E viver com um sentimento de culpa que nos esmaga e consome aos poucos não é a melhor forma de vivermos os dias que nos restam.

sexta-feira, 25 de maio de 2018

Das grandes questões que se colocam...

Acordei às seis e meia da manhã com dores de garganta. Ao pequeno-almoço tomei o comprimido do estômago e um para as dores de garganta. Foi só um paracetamol de 500mg, não se entusiasmem.

Passei a manhã com dores de garganta e dores de estômago.

Estou aqui indecisa entre tomar algo mais forte para a garganta e acabar com essas dores, sabendo que vou aumentar as do estômago, e não fazer nada e esperar que tudo isto passe.

Aceitam-se apostas.

Da Maratona de Madrid... - VII

Eu avisei que ia fazer render o tema...

Queria só mesmo deixar algumas notas soltas sobre a prova em si.

A organização foi excepcional. Desde a feira, onde todo o processo de levantamento do dorsal foi extremamente rápido, à pasta party, à prova em si, onde foi tudo impecável. Eu não tenho grande termo de comparação, não é verdade? Mas achei mesmo que funcionou tudo lindamente.

Também no próprio dia, o acesso às diferentes caixas de tempo estava bem organizado e fluído, e não havia falta de casas-de-banho! Acho que todos estes pequenos detalhes fazem muita diferença na forma como vivemos as provas.

Já na prova em si, havia alguns pormenores curiosos: ao longo do percurso havia imensos patinadores que iam andando para trás e para frente, e que distribuíam coisas como água, vaselina e um spray para as dores. Spray este ao qual eu consegui resistir até aos 35km, mas depois via toda a gente a pô-lo e achei que as minhas coxas e as minhas contraturas habituais, mereciam. Sabem aquela dica básica de não experimentar nada novo no dia uma prova? Eu achei melhor ignorá-la.

A única coisa que faltou? Laranjas. Laranjas, Senhores! Havia muitas bananas, água, isotónico, até géis. Mas não havia laranjas!... Deixei o recado no questionário de avaliação, obviamente.

Quanto ao percurso... É engraçado... Mas é duro. Ter escolhido esta Maratona para estreia, foi mais uma das minhas brilhantes decisões. Tem muitas subidas, algumas muito inclinadas, algumas muito longas. O gráfico fala por si. 


A pior parte, para mim, foi mesmo a Casa de Campo, como já referi. Mas, de resto, é uma forma curiosa de conhecer Madrid, de percorrer os locais principais, de andar pelas ruas mais importantes e de perceber que a cidade é, de facto, bastante grande. E nada plana, contrariamente ao que se possa pensar!...

Em resumo: recomendo vivamente! Talvez não para uma estreia na distância mí(s)tica, mas para quem quer fazer uma prova destas num sítio diferente. Madrid é relativamente perto, não sai caro, e é uma cidade que vale a pena conhecer.

Se eu lá volto? Pois que não!


quarta-feira, 23 de maio de 2018

Das coisas em que eu penso durante as minhas insónias...

Ando numa fase gira de insónias. Raramente consigo dormir depois das seis da manhã. Podia aproveitar para ir treinar? Podia. Mas não era a mesma coisa.

Domingo eram quatro e meia da manhã e eu estava acordadíssima. Estava de rastos depois da Estrela, tínhamo-nos deitado já depois da uma e, ainda assim, eu andei às voltas na cama...

Ontem, eram seis e meia e eu estava deitada, preocupadíssima a pensar que tenho de ir comprar um robe e duas camisas de dormir. Dramas do primeiro mundo, portanto.

Soluções milagrosas para que eu possa voltar a dormir? Ou alguém que sofra do mesmo mal e esteja disponível para jogar à batalha naval e coisas afins?

terça-feira, 22 de maio de 2018

Da Maratona de Madrid... - VI


Faz hoje um mês. Foi há um mês atrás que eu fiz a minha primeira Maratona e recebi esta medalha. Esta medalha que continua na mesa da sala, para que olhe para ela, e para que me lembre daquilo que consegui fazer.

Com tudo o que aconteceu entretanto, parece que foi noutra vida. Mas, de facto, foi há exactamente um mês.

Às vezes, ainda não acredito bem. Às vezes, esqueço-me do que fiz. Às vezes, ainda não sei como fui capaz.

Ainda não me permiti sentir-me verdadeiramente feliz por isso. Talvez um dia. Mas, por outro lado, quando me perguntam pela prova, eu só me lembro das coisas boas. Eu só me lembro que gostei, que valeu a pena, que não fora tudo o resto, eu teria sido muito feliz na Maratona de Madrid.

E esta medalha, que pesa (literal e figurativamente) mais do que qualquer outra que eu tenha, vai ter de ganhar um lugar especial cá em casa, que ainda não sei bem qual é. Para que eu me lembre. Para que eu não me esqueça. Para que eu saiba. Que quando queremos muita uma coisa, que quando nos dedicamos, que quando acreditamos, conseguimos coisas incríveis!

sábado, 19 de maio de 2018

Do Estrela Grande Trail 2018... - II

Pois que está feito.

Eu sabia que não ia ser uma prova tão feliz como a do ano passado. Era difícil, para não dizer, impossível.

Ainda assim, não esperava que fosse tão menos feliz!...

Lição número 1 nesta luta Pessoas VS Serra da Estrela: a Serra ganha sempre. Não vale a pena.

Lição número 2: ir fazer uma prova na Serra da Estrela sem treinar, é disparate. Para não dizer, pura burrice. 

Lição número 3: nunca, mas nunca, subestimar a Serra. Mesmo que seja uma prova curta. Mesmo que seja uma prova que já conhecemos. Mesmo que nos achemos "os maiores e que vamos lá e fazemos aquilo na boa". Não. Não fazemos.

Ou melhor, fazemos. Mas em sofrimento. E pagar para sofrer, ainda que seja uma opção perfeitamente válida porque cada um sabe de si, não é bem o que eu quero para mim.

Depois deste momento pedagógico para referência futura, e porque eu acredito que é importante aprendermos com os erros (e se eu hoje aprendi!), passemos ao que interessa.


Acordámos às seis e um quarto, com esta vista da janela do quarto do hotel nas Penhas da Saúde, e com o fresco dos seis graus a fazer-se sentir. O hotel, a muito custo, preparou um saco com um pequeno-almoço improvisado. Valeu-nos termos vindo prevenidos de casa. Sim, eu vim de Lisboa com panquecas e iogurtes e fruta e frutos secos e tudo e tudo e tudo.

Saímos para Manteigas e às oito foi a partida dos loucos (o meu e os outros), que iam para os 49km. Restavam-me duas horas até à minha prova!... Fui beber um chá, fui à casa-de-banho, descobri um tasco com wi-fi, vi e revi o percurso e o material, e lá chegou a minha hora.


Estas partidas são sempre relativamente calmas: éramos perto de cem atletas, o que é muito pouco. Mas o entusiasmo era muito e até eu começava a entrar no espírito. Dez em ponto e lá fomos. A prova começa com um quilómetro a descer, e depois é praticamente sempre a subir até aos 9km (com umas partes planas ou ligeiramente a descer lá pelo meio, mas coisa pouca).


Aproveitei para ir tirando fotos. Muitas fotos. Conseguem ver o coração da montanha?

A prova corria relativamente bem, eu ia a fazer o ritmo que desejava (ligeiramente abaixo do do ano passado), e claro que me sentia cansada. Mas ia gerindo. Sem muita pressão, e sabendo que a primeira parte da prova era para ser feita mais a caminhar do que a correr. Acabei por perder algum tempo nesta fase porque a dada altura me aproximo de uma rapariga que estava com uma senhora e não parecia muito bem. E não estava. Deve ter tido uma quebra de tensão, e acabou deitada no chão, de pernas para o ar, com outra corredora a dar-lhe isotónico e eu a dar-lhe uma goma, para ver se a coisa melhorava. Eventualmente, acabou por melhorar.

Estava muito, muito calor. Houve alturas em que não tínhamos qualquer sombra e estava muito quente, de facto. A Serra engana, também nisto. Porque achamos que aquilo é fresco e, na verdade, não é tanto assim... É muito fácil distrairmo-nos e não bebermos água suficiente, por exemplo. E depois acontecem estas coisas... Que, para mim, são assustadoras e são uma das coisas que me preocupa sempre no trail. Há momentos em que estamos em sítios em que, se nos acontecer alguma coisa, vai demorar até que nos possam ir buscar!... Daí que as exigências com os materiais obrigatórios possam parecer chatas, mas podem mesmo fazer toda a diferença!...


Lá continuei a correr e esta parte foi já depois do abastecimento, no Poço do Inferno, naquela que é a pior subida de toda a prova. Na foto não dá para perceber bem, mas esta subida era bem dura e difícil, pelo meio de rochas, em modo escalada e sem ter onde pôr os pés. Um dos problemas de ser baixinha revela-se no trail: a ginástica que eu faço quando tenho de subir estes "degraus" gigantes...


E aqui começa a descida, já com Manteigas ao fundo. Se no ano passado eu adorei a descida, porque fui sempre sozinha e levezinha por ali a baixo, qual cabra do monte a saltitar de rocha em rocha, este ano a descida foi particularmente difícil. Ao ponto de eu ter feito algumas partes a caminhar. Esta parte do percurso é chata porque o solo é praticamente sempre irregular, com pedras grandes e pedras pequenas soltas, e obrigam a uma grande concentração para vermos bem onde pomos os pés. Isso e obrigam a uma grande ginástica nos tornozelos. E o meu tornozelo direito não gostou dessa ginástica. E eu tive dores. Muitas. E depois a coxa esquerda juntou-se à festa. E eu tive dores. Muitas. E percebi que estava a fazer um tempo miserável em relação ao ano passado. E entre as dores e a desmoralização com o tempo que estava a fazer, foram uns últimos quilómetros difíceis.


Mais eis que volto a entrar em Manteigas. Faço aquela subida final maravilhosa. E dou comigo na passadeira amarela, com o pórtico à minha frente.

Na lateral do corredor final, algumas pessoas batem palmas e incentivam, o speaker pede um esforço final para acabar a correr e um sorriso, eu correspondo, o fotógrafo prepara a objectiva, eu passo o pórtico vermelho da Prozis, já só faltam uns metros para o pórtico final, e eis que sou ultrapassada por uma atleta, que se mete à minha frente de braços abertos e acaba a prova primeiro do que eu.

E eu fiquei parva, sem reacção. Eu sei, se calhar, sou eu que ando demasiado sensível. Eu sei, o problema sou eu, não ela. Mas confesso que mexeu comigo e me deixou com um sentimento triste em relação à prova e ao seu final. Esta atleta esteve o tempo todo atrás de mim, excepto quando foi o abastecimento, porque eu parei mais tempo do que ela. Nem duzentos metros depois do abastecimento, eu ultrapassei-a e fui sempre à frente dela. Sempre. Talvez com a minha lentidão na descida ela se tivesse começado a aproximar, e na subida final em Manteigas, eu apercebi-me que ela vinha atrás de mim. Mas atrás, sempre atrás.

Eu jamais seria capaz de ultrapassar uma atleta que fez a prova toda à minha frente, a três metros da meta!... Que gozo é que isso dá?...

Eu sei. O problema é meu. Eu é que estou errada. Ela tinha todo o direito de fazer o que bem entendesse e acabar a prova como bem queria. Eu sei. Estou a escrever a quente e um dia vou arrepender-me.

Mas fiquei triste. Pronto. Deve ser mesmo por andar sensível. Ignoremos.


Ainda está para nascer um pórtico mais bonito do que este! Gosto mesmo dele e não resisti a tirar-lhe mais uma foto, ainda que não tenha tido vontade alguma de tirar uma foto a mim mesma depois da prova.



Deixo-vos o gráfico para verem como é uma prova gira!...

Então e o resultado? Francamente pior do que em 2017, claro está. Acabei com o tempo oficial de 2h29m16s. Curiosamente, fiquei pouco pior classificada do que no ano passado em termos gerais: 44º da geral (o ano passado tinha ficado em 41º), 13º dos femininos (o ano passado tinha ficado em 11º), só piorei muito no escalão, em que passei de 4º para 8º...

Claro que isto não interessa nada, que o que interessa mesmo é participar e chegar ao fim, e yada yada yada... Digo eu a mim mesma para me convencer.

A prova foi todo um misto de emoções. Por um lado, o meu lado racional a dizer-me que eu não tinha treinado nada (lembrei-me hoje que o meu último treino de trail foi... em Janeiro!) e era impossível fazer melhor do que no ano passado. Por outro, o meu lado emocional, a querer que eu me superasse.

No fim de contas... Isto não interessa mesmo nada e agora vou para Manteigas outra vez, esperar pelo louco, e aproveitar o resto do fim-de-semana, que bem preciso. Segunda-feira vai ser um dia importante e eu quero esquecer-me disso até lá!...

quinta-feira, 17 de maio de 2018

Do Estrela Grande Trail 2018... - I

E amanhã lá vou eu em direcção à Serra da Estrela, para mais um Estrela Grande Trail.

Não sei bem o que vou lá fazer. Acabei de ler o relato do ano passado, e preocupa-me ligeiramente saber que este ano vai ser diferente. Completamente diferente.

Se o ano passado estava super nervosa e morta de medo com o que ia encontrar, ao mesmo tempo que me sentia entusiasmada porque era o meu 3º ou 4º trail e, sem dúvida, o mais difícil, este ano estou mais em modo "vou lá passear e não quero saber, só espero não sofrer muito".

Esta ida à Estrela não estava exactamente nos planos. Quando o ano passado acabei a prova, e feliz e contente que estava com o meu resultado, disse que gostava de lá voltar para tentar um 3º lugar. Uma pessoa pode sonhar, não é verdade? Mas o louco mais louco que eu, a quem a prova correu terrivelmente mal (e a muitas outras pessoas que fizeram os 49km porque, de facto, houve muita coisa que não correu bem e não foi só o calor excessivo), disse que não queria lá voltar. E eu nunca mais pensei nisso.

Entretanto surgiu a maratona, treinos e treinos e treinos, e eu com outras preocupações.

A dada altura, o louco mais louco que eu começou a olhar para o calendário de provas e a perceber que tinha de ir à Estrela. Ou melhor, que a Estrela era a opção mais viável entre todas as disponíveis que o permitiam cumprir o objectivo que tinha: fazer o ponto que lhe falta para em 2019 irmos a Chamonix. Eu em modo passeio para me deliciar com aquelas paisagens, ele em modo louco no seu melhor, para ir sofrer no UTMB. Opções.

E foi assim que dei por mim inscrita no Estrela Grande Trail. No trail mais curto, claro. Mas não deixa de ser um trail na Estrela. Considerando que desde a Maratona corri exactamente 13,22km, o que não chega sequer à distância do trail, isto promete.

Resta-me a esperança de achar que vou tirar fotos bem giras, já que não vou correr.

Por outro lado, estou a precisar desesperadamente de uma coisa destas. Preciso de estar sozinha. De estar no meio de lado nenhum, rodeada de verde e de natureza. De não pensar em nada. De pensar em tudo. De me sentir fisicamente cansada, para que não seja apenas o esgotamento psicológico a pesar. Preciso de desligar do mundo. De estar eu e os trilhos. De me perder. De me encontrar. De me preocupar apenas com as coisas simples durante umas horas. Tenho pensado muito em voltar à terapia. Mas talvez seja esta a verdadeira terapia da qual eu preciso.

Bom fim-de-semana, Mundo!

domingo, 13 de maio de 2018

Da Maratona de Madrid... - V

E foi assim que eu entrei na segunda fase da prova, para mim. Se a primeira correu bem melhor do que esperava, e me sentia relativamente tranquila e confiante, a partir daqui, tudo mudou.

Tinha definido como objectivo a meta de fazer os primeiros 25km sem parar de correr. Os meus dois treinos mais longos tinham sido, precisamente, de 25km. Entretanto, lembrei-me que nenhum deles tinha sido inteiramente a correr (o último tinha sido uma miséria e no primeiro tinha caminhado 200 metros numa subida pavorosa), pelo que, na verdade, a distância máxima que eu tinha feito a correr era a de uma meia-maratona. Ainda assim, depois de fazer os 25km, não quis ficar por aí. Quis tentar os 26, depois os 27, depois os 28. Foi por pura casmurrice que quis chegar aos 30km sem parar de correr. E cheguei. Porque precisava de provar a mim mesma que era capaz. E fui. A partir daí, acho que morri. Mal o relógio marcou os 30km, encostei e comecei a caminhar. Num movimento estranho e desconjuntado, depois de tanto tempo a correr. Não sei se é a isto que chamam o muro. Talvez. Mas sei que morri. Não ajudou nada que este momento tenha coincidido já com o percurso dentro da Casa de Campo. Aquele parque infernal. O calor. O chão de terra batida. A monotonia do percurso. A falta de apoio. Desmoralizei mesmo e só via gente a caminhar à minha volta. Estávamos todos desanimados.

Houve, no entanto, um momento de esperança renascida quando tomei o gel da Gu. Se houve decisão sensata que eu tomei ao longo do dia, foi a de guardar este gel para este momento. O gel é espesso. Muito espesso. Mas foi, literalmente, como estar a comer um brigadeiro. E se há coisa que me pode dar ânimo, seja em que circunstância for, é a sensação maravilhosa de estar a comer um brigadeiro. Foi o meu momento zen de introspecção, para tentar ganhar forças para o que aí vinha.

Andei cinco quilómetros a sofrer naquele parque interminável. Foram, sem dúvida, os piores 5km da prova. A tentar alternar corrida e caminhada. Sem muito sucesso. Quebrei muito aqui. Mas, eventualmente, talvez porque o gel começou a fazer efeito, consegui ganhar coragem para voltar a correr e o parque estava a chegar ao fim. Claro que o parque terminava numa subida horrível. Claro. Mas, depois disso, já depois dos 35km, tivemos uma folga de subidas, tivemos um abastecimento, e  começámos a descer ligeiramente. A música certa tocou e eu fui buscar forças não sei bem onde.



Lá fui andando. E correndo. E andando. Mais correndo do que andando, e os loucos dos espanhóis que só gritavam "ya lo tienes!". Já faltava pouco. Muito pouco. E eu comecei a achar que, mesmo que fizesse o resto a caminhar, estava feita.

Mas eu não queria fazer o resto a caminhar. Tinha ido para lá com um objectivo: fazer menos de cinco horas. E havia de conseguir. Mesmo que nesta fase tenha percebido que o grande desfasamento entre o meu relógio e as marcações oficiais, baralhavam as contas que tinha estado a fazer até aí. Até aí, achei que talvez conseguisse fazer quatro horas e cinquenta. Nesta fase, percebi que estava com 700/800 metros de diferença do real. O que, naquele ritmo, seriam facilmente 5 ou 6 minutos de diferença. Comecei a achar que não ia conseguir fazer menos de cinco horas e isso mexeu comigo e desmoralizou-me. Tinha estado até aí tranquila da vida e confiante, mas foi pura burrice não ter feito estas contas mais cedo. Agora era tarde para recuperar... Foi assim que decidi que os últimos três quilómetros tinham de ser feitos a correr. E foram. Devagar, mas foram.

Lá segui eu na minha vida, a ultrapassar mais do que a ser ultrapassada, a continuar a receber os incentivos dos espanhóis. Nesta fase também ajudou, e muito, ver que o louco mais louco que eu, voltou para trás para me vir buscar. Estava no quilómetro 40, quase 41, acho, quando ele apareceu em sentido contrário. Mesmo depois de eu lhe dizer para não o fazer. Quem é que faz uma maratona, descansa e alonga, e depois volta para trás e faz mais uns quilómetros? Gente louca, claro. Mas as fotos falam por si.




(vamos embora, que agora é sempre a subir até à meta...)


Também foi muito bom sentir o apoio de quem estava a torcer por mim. Eu não lia as mensagens mas sabia que elas estavam a chegar. Sabia que havia quem estivesse a acompanhar a prova ao vivo. E foi tão bom e tão confortável saber que tinha gente a torcer por mim! 

Corria eu já no último quilómetro, quando o meu telemóvel começou a tocar. Soltei mais um palavrão (ups!) mas obriguei-me a não ver quem me estava a ligar. Passou-me tudo pela cabeça. Sabia que a qualquer momento podia chegar uma má notícia de Lisboa e tive medo disso. Mas também sabia que se fosse isso, não havia nada que eu pudesse fazer e eu tinha uma maratona para acabar.

E tinha. Já faltava pouco. Eu só queria acabar. Estava imenso calor. Estava cansada. Só queria chegar à meta. E já faltava tão pouco!

A fase final tinha outra vez imensa gente a apoiar. Palmas, incentivos, gritos de apoio.

Entrámos na recta final. Que era a subir, claro. Se começámos a subir, tínhamos de acabar a subir, pois claro.


(a foto do meu fotógrafo privado)


(a foto que, ao mesmo tempo, o fotógrafo profissional tirava)

Gostava de ter aqui uma descrição maravilhosa sobre como vi a luz, como foi uma experiência reveladora, que foram umas centenas de metros que passaram a voar e que eu adorei.

Mas não. Eu só queria chegar ao fim. Eu só queria passar aquele pórtico. Claro que me sentia feliz. Mas, ao mesmo tempo, estava como que anestesiada. Passei aquela meta e acho que só pensei: é isto? Já está? Dei uns passos, agarrei-me ao louco mais louco que eu, e fiquei ali uns momentos a olhar para o chão. A tentar absorver tudo o que tinha acabado de acontecer. Não pulei, não gritei, não chorei. Não consegui reagir. Passaram três semanas e acho que ainda não consegui reagir.



Ainda junto ao pórtico, peguei no telemóvel e vi que tinha sido o meu pai a ligar-me. Pensei o pior. Liguei-lhe. Perguntou-me se estava em pé ou sentada. Pensei mesmo o pior. Afinal, estava só a meter-se comigo para me dizer que se estava em pé era porque tinha corrido bem. Achava que eu tinha começado às nove, acreditava que eu faria menos de cinco horas, e achou que já me podia ligar. Matam uma pessoa do coração com estas coisas!...

Depois de refeita do susto, fomos buscar as medalhas e fazer a gravação do tempo. Foram exactamente quatro horas, cinquenta e seis minutos e dezassete segundos. Menos de cinco horas. Estava cumprido o objectivo.

(como é que eu acelerei nos últimos quilómetros que eram a subir? não sei...)

Quando, finalmente, li as mensagens do durante e as mensagens de parabéns quando acabei, não pude deixar de, mais uma vez, me sentir uma sortuda! E de ficar de lágrimas nos olhos, pois claro. Aí desse lado estão pessoas incríveis que me deram uma força tremenda e que tiveram um grande contributo em todo este processo. Já o disse, mas repito: esta medalha também é vossa!

Depois de mais umas fotos e de comer e beber o que ofereciam, era hora de regressar ao apartamento, de medalha ao peito. Ter marcado um apartamento a 1,5km da meta revelou-se muito sensato.Voltámos a pé, em modo recuperação activa.

E depois foi tomar banho, descansar, comer e beber. E tentar processar tudo o que aconteceu.

Sou maratonista. Fiz a minha primeira maratona. Se um dia me dissessem que eu chegaria a isto, eu não acreditava. Era pessoa para apostar que jamais tal aconteceria. Mas parece que sim.


22 de Abril de 2018 - EDP Rock'n'Roll Madrid Maratón - 4:56:17

sábado, 12 de maio de 2018

Do meu estado actual...

Pois que nada como uma bebida dos Vikings para curar toda e qualquer maleita!


De um dia normal na minha vida...

Vou ao dentista.

Acabo deitada numa marquesa, de rabo ao léu (literalmente), a levar uma injecção de corticóides.

Reacção vagal ou reacção à anestesia? Não se sabe.

Mas que me deu uma coisinha muito má, deu. Que eu achei que não conseguia respirar, achei. E que não falta animação na minha vida, não falta.

quinta-feira, 10 de maio de 2018

Da Maratona de Madrid... - IV

Não, ainda não vos trago o restante relato. Talvez no fim-de-semana ou amanhã à noite, que hoje tenho de ir à inauguração do novo sítio mais giro da cidade (more about that later).

Venho apenas registar que a unha do dedo grande do meu pé esquerdo, que me começou a doer depois da Maratona, tem uma mancha negra que todos os dias se alastra mais um bocadinho e que eu acho que isto não vai ficar por aqui.

Se ser maratonista é isto, já não quero.

quarta-feira, 9 de maio de 2018

Dos medos...

Em conversa com a BFF. Ela pergunta-me: "medo do sim e medo do não?". Eu respondo que sim e que não sei de qual deles mais.

É isto. É tão isto. Medo do sim. Medo do não.

Não saber o que será pior. Não saber o que será melhor. 

Coisa difícil, esta de viver!

terça-feira, 8 de maio de 2018

Da Maratona de Madrid... - III

Falemos então do primeiro quilómetro. Mas só do primeiro! Acham que eu consigo fazer isto render 42 posts e mais um extra pelos 195 metros? Tinha a sua piada, não?

Não. Pois que não.

Portanto...

Chegou o Domingo. O dia M. O dia 22 de Abril.

Acordei antes do despertador, pois claro. Nestas alturas acordo sempre com um espírito super focado e racional: tudo pensado, tudo cronometrado, tudo organizado ao milímetro. Acordar, tomar o pequeno-almoço (optar por um apartamento é fundamental por causa desta parte), vestir. Preparar tudo. Ver e rever se está tudo. Tentar enfiar os géis e as gomas todas na bolsa da cintura. Mais o telemóvel. Mais uns lenços de papel (just in case). Tirar as últimas fotos pirosas em frente ao espelho, já com o dorsal colocado. Sentir um nervosismo tremendo acompanhado de um entusiasmo tímido.

Claro que, apesar de tudo, saímos atrasados do apartamento. Claro que eu estava super nervosa. Claro que, por mim, tinha ido a correr até à partida. Mas não. Fomos de metro. E quando cheguei ao metro e vi muita gente que também ia para a prova, relaxei um pouco em relação às horas.

Chegámos ao local de partida com cerca de meia hora de antecedência. O que não é muito, obviamente. Fomos à casa-de-banho e fomos à procura dos nossos "cajóns". O meu era o último, naturalmente. O dele era outro, mas já nem me lembro qual.

Estava muita, muita, muita gente. Os números oficiais falavam em 33 mil participantes para as três provas e 11 mil para a maratona, sendo que a meia e maratona partiam juntas. Era mesmo muita gente! Ainda assim, não achei confuso, não havia filas por aí além para as casas-de-banho e a entrada nos "cajóns" parecia funcionar bem.

Comecei a entrar no espírito, a sentir-me nervosa porque tinha de percorrer aquilo que me parecia um caminho infinito até chegar ao meu "cajón", e a hora a aproximar-se. Mas lá cheguei. 

E chegou a hora da despedida. E eu abracei-me ao louco mais louco do que eu. E as lágrimas começaram a encher os meus olhos. E eu a olhar para o céu e a tentar respirar fundo. E eu agarrada a ele com as lágrimas a cair. Ele a insistir que ficava comigo. Eu a mandá-lo embora para o "cajón" dele. Ele a insistir que ficava. Eu a dizer-lhe que era um disparate tremendo estar a prejudicar-se numa prova destas por causa disto. Ele a insistir que ficava. E acabou mesmo por ficar e eu senti-me muito grata por isso. Sei que se tivesse ficado sozinha, ia ser um inicio ainda mais difícil. Já assim, o esforço para controlar os soluços e as lágrimas foi tremendo. Quando tocou o We Will Rock You, a emoção foi enorme. Os arrepios eram muitos e eu cada vez mais nervosa, mais emocionada, mais tudo. 

A espera até ao início da prova foi longa e sofrida. Mas, a pouco e pouco, fomos ficando mais próximo do pórtico da partida. E as emoções cada vez mais fortes. Até que chegou a hora. Última despedida. Ele de sorriso nos lábios, eu a perguntar-me o que raio fazia ali. E a prova começou. Eram 9h18 quando eu passei o pórtico da partida e comecei a minha primeira maratona.

Sabem aquelas pessoas super tontas que nós vemos a sair da prova para ir à casa de banho pouco depois da partida e ficamos a pensar por que raio não foram antes da prova começar? Eu fui uma dessas pessoas. Pouco depois de entrar no "cajón", achei que precisava de ir (outra vez) à casa-de-banho. Mas não queria abandonar o louco mais louco que eu, que ali tinha ficado comigo. E queria perceber se aquilo eram nervos apenas. Mas não. Comecei a correr e percebi que a minha bexiga estava a sentir-se demasiado pressionada e que a coisa não ia correr bem. Seiscentos metros depois da partida, eu saí da corrida para ir à casa-de-banho. Mas que fique registado que não fui a única!..

Assim, tive um primeiro quilómetro muito lento... Mas valeu a pena porque parecia que depois ganhei nova força. O facto de ir na recta final da prova, e com menos confusão, também ajudou.

E lá fui. Os primeiros quatro quilómetros foram sempre a subir, o que é uma excelente forma de se começar uma maratona. Só que não. E lá fui. A tentar gerir. A tentar não me entusiasmar. A tentar não deixar que a subida me vencesse. A tentar mentalizar-me de que tudo aquilo era real e que estava a fazer a minha primeira maratona.

Os primeiros quilómetros foram, de facto, duros. Não só pela subida, mas por me sentir sozinha, por ainda ter as emoções todas à flor da pele, por todos os medos e dúvidas, pelos pés e pernas cansados a acusar a falta de descanso dos últimos dias. Era inevitável questionar-me se seria capaz de fazer uma prova daquelas, depois de tudo o que tinha acontecido, depois de tudo o que não tinha descansado, depois de tudo o que não tinha treinado na última semana. Mas lá fui.

Tentei manter-me num ritmo estável mas rapidamente percebi que isso era impossível. Com tanto sobe e desce, era muito difícil conseguir manter sempre o mesmo ritmo. Como tinha começado muito lenta, e o início era a subir, queria ir recuperando a pouco e pouco, e manter-me nos 6'30/6'35 (quem nasceu para tartaruga, nunca chegará a lebre...). E ia olhando para o rimo médio no relógio e a coisa estava a correr bem.

A única coisa que corria menos bem, é que depressa percebi que havia um certo desfasamento entre o que o meu relógio marcava e as marcações dos quilómetros ao longo do percurso. Acabei por pagar caro por isso no final (lá chegaremos).

 


Mas lá fui andando. Com tempos pouco estáveis. A ficar preocupada de cada vez que fazia um quilómetro mais rápido. Sabia que qualquer entusiasmo excessivo nesta fase, ia-me ser cobrado mais adiante. Assim, mesmo nas descidas, não me soltava muito.

E a coisa ia correndo relativamente bem. Os espanhóis são o que se sabe, ainda que não se tenham feito ouvir tanto nos quilómetros inicias. Mas bastou voltarmos mais para o centro, e era vê-los a gritar e a bater palmas nas ruas.

Houve um momento muito revelador nesta fase. Foi quando virámos à direita e entrámos na Velázquez. Foi mais forte do que eu. Eu olhei para aquela subida e não pude evitar um palavrão. Daqueles a sério. Descobri que, entre todas as outras coisas, a maratona fez-me dizer palavrões. E este foi o primeiro. Apesar de ter continuado sempre a correr, este foi o meu primeiro quilómetro mais lento, pois à subida juntou-se um abastecimento. Eu nunca parei nos abastecimentos, mas, por vezes, abrandava para tentar não tomar banho de isotónico. Um dia hei-de ser super croma e hei-de conseguir beber de copos enquanto corro sem qualquer problema. Ou então não.

(não faço ideia onde foi tirada esta foto mas sei que ainda foi no início)

O momento verdadeiramente marcante da primeira fase desta maratona foi a separação da meia e da maratona, que seguiram juntas até ao quilómetro 17. Depois, eles seguiram em frente e nós virámos à direita. Eu temia esta separação. Tinha medo de vacilar, de hesitar, de pensar em seguir em frente. Não esperava, nem um bocadinho, o que ia acontecer. Os corredores que seguiam para a meia não paravam de bater palmas, de nos incentivar, de gritar palavras de ânimo, de nos chamar campeões. Estou arrepiada só de me lembrar! A emoção, Senhores! Como é que uma pessoa não chora que nem uma madalena numa altura destas?! O que me custou! Vocês sabem lá o que é tenta correr e só querer chorar! Eles a baterem palmas e eu de lágrimas nos olhos. A tentar não soluçar. O que senti é indescritível. Foi incrível a força que os outros corredores davam a quem seguia para a maratona. E eu de lágrimas nos olhos, enquanto virava para a maratona e me perguntava se era merecedora daquilo tudo e se seria, de facto, capaz. Mais uma vez, a questionar-me e a perguntar-me se não deveria seguir para a meia. Mas não segui. Obviamente, não segui.

Pouco depois disto passámos por um viaduto onde estava mais um abastecimento com uns carros de bombeiros, e os respectivos bombeiros, sendo que um deles estava com um megafone a gritar palavras de ânimo e todos a bater palmas. É impossível ficar indiferente a isto! Uma pessoa arranja logo forças nem sabe bem onde e lá vai fazendo quilómetro após quilómetro, vendo o tempo a passar.

E foi assim que cheguei à meia. Metade já estava. O meu relógio dizia-me que eu estava com cerca de duas horas e vinte, e isso parecia-me bem. Chegar à meia foi, obviamente, um marco importante, mas coincidiu com a parte em que andámos mesmo pelo centro de Madrid, pela zona das compras, e houve ali uma altura em que estava mesmo a sentir-me incomodada pelo percurso. Estava a ficar com uma pequena neura, porque passávamos pelo meio de muita gente, em ruas mais estreitas, com empedrados terríveis, e eu estava a sentir-me desconfortável com isso. 

(esta foi nessa fase no centro e eu nem para a foto consegui sorrir...)

Pouco depois, junto ao Palácio Real, mesmo ao meu lado vejo uma atleta cair. E não foi bom. Ela caiu, magoou-se mesmo, e eu parei mas percebi que ela estava acompanhada e vi os colegas dizerem-lhe que não era nada (ainda que ela tivesse a testa raspada e a escorrer sangue...). Com o apoio dos colegas, ela lá continuou a correr. Mas, claro, aquilo mexeu comigo, que já vinha meio abalada, e fiquei durante um tempo a pensar no que seria se me acontecesse o mesmo.

E foi assim que entrei naquilo que foi, para mim, a segunda fase da maratona.

Não percam o próximo episódio porque eu... Também não!

domingo, 6 de maio de 2018

Do meu estado actual...

No sofá.

Já comprei bilhetes para o Fantasma da Ópera (perdi um bocadinho a cabeça... mas só um bocadinho...) e já fiz uma reserva para almoçar num dos restaurantes do Jamie Oliver.

Nada como começar a planear a próxima viagem para tentar que o dia de hoje tenho algo de positivo.

Da Maratona de Madrid... - II

Agora que passaram duas semanas, parece-me razoável começar, finalmente, a escrever sobre o assunto. Naturalmente que, uma vez que uma pessoa (ou esta pessoa, pelo menos) só faz uma maratona uma vez na vida, vou ter de fazer render o tema e talvez em 2020 ainda esteja a escrever sobre isto. Ou talvez não. Vamos ter de esperar para ver.

Comecemos pelo princípio. Não podia contar já o final, não é? Temos de manter aqui algum suspense. 

Comecemos então pelo antes.

O estado de espírito quando fui para Madrid, na véspera da Maratona, não era mesmo o melhor. Estava demasiado anestesiada para conseguir processar tudo o que estava a acontecer e, mais do que isso, o que ia acontecer no dia seguinte.

Aterrámos em Madrid perto da hora de almoço e o plano era irmos directamente à Expodepor, na IFEMA, por ser perto do aeroporto. E fomos.

Ao chegar à zona da feira, e ao começar a ver aquela gente toda, começou a surgir em mim algum entusiasmo com o que aí vinha. Quando, logo à entrada da feira, me deparei com um mural gigante com os milhares de nomes de todos os inscritos, não pude deixar de parecer uma barata tonta à procura do meu nome. E ele lá estava. E eu comecei a perceber no que estava metida.


(o momento em que este blogue deixou de ser anónimo e eu não quero saber... Olá! Eu sou a Inês!)

Seguiu-se o levantamento do dorsal, em que perdi uns bons dois minutos. Acho que perdi mais tempo a olhar para ele do que a levantá-lo. Era real. Tinha o dorsal nas mãos e aquilo ia mesmo acontecer. Tive de me agarrar ao louco mais louco que eu, porque só me apetecia chorar (vai ser uma constante em tudo que aí vem...). Depois, fomos levantar as tshirts. Mais dois minutos na fila. Tirámos umas fotos e decidimos ir almoçar e voltar à feira já de barriga cheia.


Eu nunca fui a nenhuma pasta party, pelo que não tenho comparação possível. Mas gostei desta. Como em tudo até aí, super bem organizada, com pouca fila, com zero confusão, com gente em todo o lado a explicar tudo. O almoço em si era massa com molho de tomate e chouriço com queijo, laranja para sobremesa, pão e bebidas diversas à escolha. Podíamos repetir as vezes que quiséssemos, mas eu fiquei pela primeira dose, depois de andar a catar o chouriço todo para o prato do louco mais louco que eu.


(olhar para o percurso num mapa maior do que eu foi um momento muito esclarecedor...)

Depois do almoço ainda demos mais uma volta pela feira, comprámos isotónico para irmos bebendo, eu comprei uma pulseira com uma medalha alusiva à Maratona, visitámos alguns stands e decidimos que o melhor mesmo era ir para o apartamento descansar.

Descansar. Essa coisa fantástica que eu não tinha feito nos dias anteriores.

Descansámos e depois saímos para jantar. Fomos a um italiano maravilhoso que eu já tinha reservado perto do apartamento. No caminho para o restaurante passámos, por coincidência, no Paseo del Prado, onde já estavam a preparar tudo para o dia seguinte. Ver aquela que seria a recta final e o pórtico da meta já montado mexeu comigo. Só me apetecia chorar, mais uma vez, ao mesmo tempo que me sentia entusiasmada. Apetecia-me gritar às pessoas na rua que no dia seguinte eu estaria ali a cortar aquela meta. Foi só uma vontade. Não gritei com ninguém. Mas podia ter acontecido.


Enchemo-nos de massa, bebemos muita água, demos uma volta a pé e regressámos ao apartamento.


Era chegada a hora de preparar o equipamento, os géis e afins, os phones, e o dorsal. Não tenho nenhuma daquelas fotografias com tudo a postos que ficam muito bem. Mas vi e revi tudo várias vezes. Só fiquei na dúvida quanto às meias, que acabei por escolher no próprio dia. Sim, eu sou óptima a tomar decisões. Sim, as meias (a par dos ténis) são daquelas coisas que devem mesmo ser decididas atempadamente e testadas e tudo e tudo. Mas eu sou eu. Nada a fazer.

Deitei-me, com a certeza de que não ia conseguir dormir. A pensar que não me tinha alimentado como devia nos dias anteriores, que não tinha bebido água suficiente, que não tinha dormido nem descansado nada de jeito. Com a certeza que a minha semana antes da Maratona tinha sido tudo o que não deve ser uma semana antes de uma Maratona. Mas a pensar também que já não havia nada a fazer e que agora era mesmo ir lá e correr. O que conseguisse. O que pudesse. 

E, eventualmente, adormeci. 


Os devaneios Agridoces mais lidos nos últimos tempos...