Porque no que diz respeito ao Amor, somos todo uma grande casa em permanente construção.
Temos as nossas fundações, que somos nós próprios, aquilo de que somos feitos, as nossas crenças, o nosso passado, os nossos sonhos, as nossas cicatrizes.
Depois das fundações, vamos construindo o resto da casa. Construímos as paredes. Construímos janelas de onde vamos espreitando. Construímos uma porta.
E um dia abrimos essa porta. E deixamos alguém entrar.
Primeiro, para o hall de entrada, timidamente. Depois, a pouco e pouco, para o resto da casa.
E vamos continuando a construir a casa em conjunto com a pessoa que acreditámos ser a certa para um projecto de vida. Escolhemos de que tom queremos pintar a nossa vida. Escolhemos o colchão e o sofá que nos dão conforto. Escolhemos a decoração. Tiramos fotografias e penduramos molduras. Criamos memórias. Criamos raízes. Instalamo-nos e deixamos que se instalem.
Construímos a nossa casa acreditando que é para a vida. Que é aquela a nossa zona de conforto, que nos protege, que nos abriga, que nos dá os momentos bons e os menos bons, mas que é parte de nós.
Mas, a pouco e pouco, a casa vai-se degradando. Há uma pequena infiltração na casa-de-banho. Há um cortinado que se rompe. Há uma moldura que cai e se parte. Vamos pondo remendos, vamos reparando, vamos substituindo o que é substituível. Mas há infiltrações que corroem a estrutura, que minam o interior da casa, que chegam às fundações.
E a casa vai ficando instável. A casa vai abanando. Pelas frestas das janelas mal vedadas vai entrando frio. E percebemos que a nossa casa, o nosso porto de abrigo, já não nos é tão confortável. Já não é o nosso sítio perfeito. As cores que escolhemos já não nos agradam. O colchão dá-nos dores nas costas. As molduras penduradas retratam momentos de que já não nos lembramos.
Aos poucos, a nossa casa deixa de ser a nossa casa e transforma-se num velho edifício degradado a que não nos apetece regressar.
Até que um dia há um terramoto e a casa cai. A casa desfaz-se. A casa fica destruída. Não há nada a fazer. Não temos em nós forças para a reconstruir. Não temos em nós vontade para a reconstruir. E, no fundo, sabemos que mesmo com toda a força e vontade do mundo, não haveria nada a fazer. Aquele projecto a dois caiu por terra.
Resta-nos limpar os escombros. Deitar fora o entulho que fica. Deixar novamente a descoberto as fundações. Repará-las. Fortificá-las. Reconstruir o que foi destruído. Aceitar as marcas que ficaram e torná-las parte de nós. Das nossas fundações. As fundações que, por mais terramotos que haja, por mais abanões que sofram, nada pode destruir.