- Agridoce... Se eu te contar uma coisa, prometes que não ficas chateada?
- O que foi?
- Diz lá... Ficas chateada?
- O que é que tu andaste a fazer?
- Oh, eu já sei que vais ficar chateada...
- Diz lá, eu não fico chateada.
- Sabes aquelas gavetas na mesa-de-cabeceira lá no teu quarto em casa dos pais?
- Sim... (eu já a imaginar o filme todo...) Andaste lá a mexer?
- Foi sem querer. Eu estava à procura não-sei-do-quê e vi lá uns cadernos teus.
- E leste?
- ... Mas eu não queria. Foi sem querer. Eu não consegui resistir. Mas olha que tu escreves mesmo bem. Tenho mesmo orgulho em ti.
- ...
- Desculpa. Tu disseste que não ficavas chateada. Mas tu escreves mesmo bem!
E lá estive eu a tentar perceber o que é que ela tinha lido. É que, convenhamos, o que eu escrevi naqueles cadernos/diários não é exactamente adequado a crianças... E lá estive eu, a manter a calma, a desvalorizar, mas a ferver por dentro a desejar que ela não tivesse lido aquilo que eu temia. E, aparentemente, não leu. Pelo sim, pelo não, tenho de lá ir resgatá-los o quanto antes.
É que se ler sobre as minhas paixões da adolescência não é exactamente grave, ler sobre o que veio a seguir, não é bonito, não. E, por mais que ela diga que eu escrevo bem e que devia escrever um livro (é tão simpática quando faz asneiras!...), também é verdade que eu não quero que ela conheça aquela Agridoce. Não agora, pelo menos. Disse-lhe que, talvez um dia, daqui a uns bons dez anos, a deixe ler o resto.
Para já, deixa-a olhar para mim e sentir orgulho. Pensar que eu sou grande e forte e que estou aqui para ampará-la. Sempre. Que é para isso que ter tantos irmãos deve servir, não?